Após o crescimento exponencial da actividade turística, nos anos seguintes à pandemia, o relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI), sobre Portugal, revela que o peso do turismo no total da criação de riqueza do país tenderá a diminuir (até 2029).
A principal razão para esta trajectória, reside no abrandamento da economia global, com inevitáveis repercussões nos principais mercados emissores. O turismo é, neste momento, o garante do excedente na balança comercial (em comparação com a exportação de bens), fazendo com que qualquer perturbação externa tenha um forte impacto na cadeia de valor.
Não obstante estas previsões, os dados da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), no período entre junho e setembro, deste ano, sinalizam uma taxa de ocupação média de 81% (nos Açores e Madeira o valor chegou aos 91%, com um subsequente aumento nas receitas e na duração das estadas).
Os indicadores são promissores, mas ao passo que a época alta já não constitui um desafio na pressão pela procura pelo destino (Açores), cuja promoção tem de ser continuadamente trabalhada, a sazonalidade turística é o desafio que, de momento, importa mitigar.
Tal como referido, recentemente, pelo representante da Associação do Alojamento Local dos Açores, “torna-se urgente assegurar um fluxo turístico contínuo ao longo de todo o ano, sendo, no entanto, necessário um maior investimento e planeamento antecipado, para que todas as ilhas possam beneficiar de forma justa e equilibrada, através de uma distribuição de fluxos turísticos mais cuidada”.
A distribuição equitativa dos fluxos turísticos por todas as ilhas é algo pelo qual devemos pugnar, sabendo de antemão que as condições de acolhimento (oferta de alojamento, restauração, animação turística, viaturas de aluguer, transportes públicos), em todas elas, diferem consideravelmente.
Para além do mais, importaria saber qual a receptividade dos residentes ao incremento da actividade turística, na medida em que é necessária uma disponibilidade acrescida de quem trabalha, nesta área, sobretudo, quando se trata do tempo de lazer (ou de férias) de quem nos bate à porta. E isto, como sabemos, não é óbvio.
O crescimento do turismo no arquipélago é fruto do investimento na notoriedade externa, da melhoria transversal na oferta e da complementaridade dos serviços, em que a natureza foi, e continua a ser, o nosso melhor cartão de visita, aproveitando uma tendência crescente pela procura de locais alternativos (ao turismo de massas), nomeadamente, no turismo de natureza, e como fuga aos locais instituídos e aos roteiros obrigatórios.
Em The Tourist Gaze (1990), John Urry introduz o conceito “tourist gaze”, o qual explora a forma como os turistas olham e interagem com os destinos que visitam.
Para Urry, a democratização do turismo, embora possa conter aspectos positivos, levanta um conjunto de questões e de ambiguidades, na medida em que a expansão da actividade turística poderá conduzir à homogeneização e ao consumo das experiências de forma padronizada, reduzindo a autenticidade dos locais e transformando-os em produtos (indiferenciados) para atender à crescente procura.
O equilíbrio que procuramos balança, de forma ténue, na intermediação de interesses aparentemente antagónicos, e de diferentes percepções sobre o que significa um crescimento sustentável, sujeito a posições erróneas e que podem gerar equívocos sobre aquilo que queremos ser.
Quando afirmamos que não somos, nem queremos ser um destino de massas, estamos a dizer exactamente o quê?
[+] publicado na edição de 29 outubro 2024 do Açoriano Oriental