Participei na Periférica, um seminário promovido pelo Walk & Talk, enquadrado no Programa de Conhecimento do Festival, que visou discutir a “Programação Cultural” o seu “âmbito, escala e relevância”.
Esta iniciativa antecede a realização do festival (que se realiza no mês de Julho) e é uma chamada de atenção para a necessidade, premente, entre nós, de uma reflexão crítica em torno da criação artística contemporânea.
O seminário contou com a participação de oradores locais, nacionais e internacionais, cada qual com uma perspectiva pessoal mas com muitos pontos em comum, demasiados até, quando se olha para as geografias envolvidas.
Parece-me relevante que o Walk & Talk procure marcar uma presença no calendário para além do tempo de realização do Festival, propriamente dito, e desta forma, procure disseminar a discussão, a reflexão com quem aqui trabalha todo o ano, através do paralelo com exemplos de latitudes distantes da nossa, cuja proximidade encontramos nos objectivos e na missão em que procuram trabalhar.
A partilha de experiências e de conhecimento são importantes para o desenvolvimento de novas competências e serve como elemento comparativo, numa análise crítica ao trabalho de cada um. Muitas vezes serve apenas para comprovar que as práticas vigentes são semelhantes em quase todos os locais, alterando-se, como é óbvio, mediante questões de “âmbito, escala e relevância”.
Este exemplo evidencia, a par de outras iniciativas que se têm desenvolvido no nosso meio cultural, a importância de não perdermos o contacto com a realidade que nos rodeia, sendo que é para ela que, numa primeira instância, o nosso trabalho se confronta, para depois ganhar outra relevância quando confrontada, num plano posterior, noutro âmbito.
Para que tal aconteça, importa, acima de tudo, ter presente e conhecer, com rigor, as condições de trabalho dos artistas/criadores regionais a uma escala que é nossa.
Considero erróneo, e desajustado, fixar pontos de comparação com realidades que distam, em quase tudo, da nossa. Não quero dizer que não devamos olhar para os bons exemplos que daí advêm. Aliás, o que me parece fundamental, é saber aplicar, à escada e ao contexto da(s) ilha(s), modelos de criação, fruição e de gestão que sirvam de referência ao desenvolvimento do tecido criativo regional.
Neste sentido, é importante investir em iniciativas que façam a ponte entre quem aqui trabalha e que, no âmbito de uma residência artística, um workshop, uma formação técnica, ou simples conferência, partilhe conhecimento com quem está mais longe dos centros, onde este tipo de experiências é mais regular, está disseminada de forma mais abrangente, e não se encontra reduzido a uma cadência pontual e para um público circunscrito, como é o nosso caso.
Deste modo, é necessário amplificar os círculos, deste conhecimento, a um público cada vez mais alargado, e não apenas afunilar este capital para um público que já o detém. Não pretendo excluir ninguém, parece-me importante, no que à relevância diz respeito, que consigamos contaminar, pela acção cultural que desenvolvemos, um cada vez maior número de participantes, em particular, aqueles que ainda não são consumidores regulares de produtos culturais.
Para tal, importa apostar num trabalho de mediação de públicos, trabalhando em estreita parceria com as escolas e outras entidades formativas, na medida em que “uma comunidade emancipada é uma comunidade de contadores e tradutores” (Jacques Rancière, 2010).
A periferia que aqui se vive é tanto geográfica, como cultural. Iniciativas como esta visam tornar este caminho mais acessível, sendo que ele não óbvio para uma imensa maioria.
No final, a programação cultural tem de encontrar a escala adequada sem dispensar de “sentir o espírito do tempo” (António Pinto Ribeiro, 2009), sem pretender ser aquilo que não é (ou o que somos) mas apontando, sempre, pistas de futuro (progresso).
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