Três anos passados do anúncio desta aspiração, não encontro nada que me indique o que está a ser preparado para que tal aconteça.
A Cultura é quase sempre (des)considerada ou tida como uma coisa menor, desenvolvida por uns malandros subsidiodependentes com tempo livre e nada para fazer.
O tempo passou mas o preconceito mantém-se. E nestes dias, de maior constrangimento financeiro, ganhou nova força. Infelizmente, este discurso não escolhe ideologia e circula (abundantemente) em muitos dos corredores do poder.
No entanto, existem excepções mas há sempre quem configure a Cultura como um utilitário, nem que seja pelo lado figurativo ou simbólico na prateleira do adorno institucional.
Neste sentido, é muito provável ser este o entendimento, na aplicabilidade desta opção, através da qual podemos almejar cumprir com a métrica europeia apenas com a teoria económica, sem a capacitação da população em termos educacionais e culturais.
A economia ignora a realidade (social) para apenas se fixar no output.
A falta de ambição mina e define muito daquilo que somos.
Em sentido oposto, o excesso de ambição, o facilitismo ou até a irrelevância e ignorância da acção política, definha a estratégia de desenvolvimento para uma cidade ou até mesmo para uma região.
Não há uma ideia agregadora e com objectivos concretos (a médio e a longo prazo) quanto a este desígnio.
É isto que cogito acerca do vazio desta intenção (a de candidatar Ponta Delgada a Capital Europeia da Cultura).
Em sentido contrário estão outras cidades nacionais candidatas ao mesmo título, a saber: Coimbra, Aveiro, Guarda, Leiria e Viseu, na região Centro, ou Braga e Viana do Castelo, no Norte, Cascais e Oeiras, na área de Lisboa, e Évora e Faro, no Sul do país.
Ponta Delgada não figura em nenhuma pesquisa sobre o tema.
Os concursos para a atribuição do título de Capital Europeia da Cultura começam seis anos antes, sendo que na passada semana ficamos a saber que a Guarda apresentou o grupo de trabalho, que ficará responsável pelo processo de candidatura a apresentar em 2021.
Por cá, quando é que perspectivamos iniciar este processo? Ou este objectivo não era para levar a sério? Se assim é, que sentido é que faz designar este propósito se não é nossa intenção levá-lo até ao fim? Não será este um dos problemas do descrédito em torno da política e dos políticos, o real comprometimento para com os seus concidadãos ou naquilo que se entende por uma política de verdade?
A meados da década passada, a par com um grupo de personalidades, acreditei ser possível candidatar os Açores a Região Cultural Europeia, e não apenas com a participação de uma ou mais cidades, mas com o todo regional, com todas as suas potencialidades e fragilidades, na medida em que a realidade insular, da ilha ou do concelho, é muito díspar e está longe de ser aquela que Ponta Delgada, por exemplo, representa.
Nesta linha de pensamento, o secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado, referiu, por estes dias, que neste tipo de projetos “sobretudo numa Europa que é cada vez mais uma Europa das regiões”, onde “as regiões são priorizadas, em termos de desenvolvimento”, faz todo o sentido “pensar-se numa escala regional”.
Contrariamente a tudo o que se passa, continuamos a agir de forma individualizada e pouco estruturada.
E para que conste, a Cultura não é um napperon, o investimento (continuado) neste sector representa desenvolvimento e progresso.
Importa reafirmá-lo, sem pudor.
* Título original: A Cultura não é um napperon
* Publicado na edição de 19/03/18 do Açoriano Oriental
** Blog X
*** Twitter X
**** Email X
Sem comentários:
Enviar um comentário