terça-feira, 6 de julho de 2021

O tempo que foge não é habitável

O país desconfinou na incerteza do dia seguinte. Não por confiança mas, sobretudo, por (imperiosa) necessidade. 

Ao fim de dois meses, os casos voltaram a subir e a pressão económica (essencialmente turística) fez disparar os internamentos, sendo que (agora) a gravidade e a letalidade são (hipoteticamente) menores (e terão como alvo preferencial grupos etários mais jovens). 

O número (diário) de vítimas associadas à Covid-19 passou a ser uma banalidade, remetida a nota de rodapé do boletim noticioso (à hora de jantar). 

O (alto) risco mantém-se. Mas do pânico inicial (vivenciado em abril e maio do tempo que celebramos ter terminado), passamos à saturação colectiva e ao egoísmo narcisista (à porta fechada). 

Ao contrário do que possamos desejar, a imunidade de grupo não (nos) garante a ausência de casos e o contágio. 

Contudo, há quem considere que a vacina é a (sua) bolha de salvação (e cura eterna), contrastando com aqueles que a recusam por medo (de um destino pior do que aquele que lhes é prometido), alimentando um rol (absurdamente credível) de teorias da conspiração (facilmente propagável no scrolling da timeline).  

O facto é que “uma única dose da vacina não confere um grau de protecção tão elevado e que, por isso, é necessário que as pessoas mantenham todos os cuidados, já mesmo depois de serem inoculadas” (Público,23/06/21).

Um dado que convém (sempre) relembrar, reiterando a importância de aceder a informação (credível).

No arquipélago, o processo de vacinação tem permitido um relaxamento das medidas sanitárias, em particular, nas ilhas onde foi possível ter a colaboração da task-force (para o plano de vacinação contra a COVID-19 em Portugal).

Por ser a maior ilha, com mais população, São Miguel tem assistido a um incremento do processo de vacinação, sem que, no entanto, estes dados tenham (ainda) influência na diminuição no número de casos (positivos) que a continuam a martirizar.

O comprometimento de agir em conformidade (com as regras impostas) é algo que cabe, a cada um de nós, cumprir, na individualização de um acto colectivo (que todos atinge por igual).

O apelo à responsabilidade individual impõe-se mas temos de aprender a viver com uma realidade (nova) que não desaparecerá por decreto.

Para tal, temos de equacionar a retoma progressiva, dentro da razoabilidade possível, de todos os quadrantes da nossa vida colectiva.

Neste sentido, importa encarar com seriedade a reabertura do sector cultural, tal como anunciado na passada quinta-feira pela Secretária Regional da Saúde, impondo medidas que, atendendo à evolução da pandemia, possam permitir o regresso ao(s) palco(s).

Mais do que uma excepcionalidade, é solicitado que seja aplicado o mesmo critério que tem permitido que outros sectores económicos possam funcionar (mesmo que o nível de risco concelhio seja elevado).

Por uma questão de equidade e coerência, parece-nos fundamental a assumpção deste compromisso.

Simbolicamente, seria o reconhecimento que “o tempo que foge não é habitável” (Byung-Chul Han, 2019).

+ Publicado na edição de 26/06/21 do Açoriano Oriental 
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