O suplemento
Fugas, publicado com a edição de sábado do jornal Público, deu uma
Volta às Ilhas, num périplo contemporâneo pelos arquipélagos dos Açores e da Madeira, no ano em que se assinalam os 90 anos d’“As Ilhas Desconhecidas” de Raul Brandão.
Do Corvo a Santa Maria são sugeridos itinerários que revelam histórias, e lugares, uns mais familiares do que outros. Por exemplo, o Ecomuseu na ilha do Corvo, um projecto promovido pela Direcção Regional da Cultura, paradigma em curso de um trabalho construído com a comunidade, na medida em que se apresenta como um “museu vivo”, “dinâmico” e “sustentável”. Na ilha em frente, é-nos dado a saber a recuperação integral da Aldeia da Cuada, uma “ilha dentro da ilha” que revive um tempo que não este, e que faz as delícias dos viajantes que aportam às Flores.
Daqui passamos à Graciosa. Conhecida pelos seus burros, que agora não serão mais de 70, adoptados por um cenógrafo italiano que vive na ilha e que já trabalhou com realizadores de renome, como Martin Scorcese, Bernardo Bertolucci ou Frederico Fellini, cujo interesse na divulgação e preservação, desta espécie, levou a que a mesma tivesse sido reconhecida como raça autóctone. Já na Terceira, os nossos viajantes descobrem o Algar do Carvão, um local de visita obrigatória para quem queira saber o que se passa no coração da ilha e descobrir a beleza escondida no interior da terra.
Em São Jorge, numa visita obrigatória à Fajã do Santo Cristo e às amêijoas que se tornaram famosas, os jornalistas lançam um desabafo de quem fez o caminho a pé: “
Pensamos com os nossos botões que, apesar do cenário idílico e quase irreal, deve ser preciso coragem para morar num lugar assim, inóspito, fora do tempo”. Esta, também, podia ser uma síntese do que é viver nos Açores. E, convenhamos, não é para qualquer um.
Dos trilhos pedestres, ao café da Fajã dos Vimes, ao queijo do Manuel Silveira e ao atum de Santa Catarina, atravessamos o canal para chegar ao Pico. Esta é uma das maiores riquezas do Grupo Central, a proximidade física e visual entre as ilhas, cuja potencialidade tem de ser mais rentabilizada. Mas, para que isso aconteça, são necessárias vontades que não apenas as oficiais.
Ao longo dos últimos anos, o Pico tem gerado um burburinho crescente. A imensidão da ilha contrasta com a baixa densidade populacional. O turismo em espaço rural é um dos seus maiores trunfos. E é, por aí, que deve caminhar o desenvolvimento turístico da ilha Montanha. A revitalização do sector vitivinícola e a classificação da Paisagem da Cultura da Vinha, pela Unesco, são activos importantíssimos, que devem ser mantidos e preservados a todo o custo. Todos estes factores, conjugados com um conjunto museológico exemplar, fazem com que se olhe para o Pico com um orgulho incontido.
Chegados à Horta, há mais do que o Peter’s e o seu gin. Destaque natural para o Jardim Botânico do Faial, onde são conservadas “sementes de todas as ilhas” e onde cabe “toda a flora endémica dos Açores”. Há tempo, ainda, para visitar o Vulcão dos Capelinhos, e o seu Centro Interpretativo, descobrir o artesanato com miolo de figueira e para uma saída de barco à procura de uma baleia-azul.
Chegados ao Grupo Oriental, começamos por Santa Maria, a primeira ilha a ser descoberta e a mais antiga do arquipélago. É isso, pelo menos, o que nos dizem os seus fósseis. O Barreiro da Faneca é, obviamente, um ponto de paragem obrigatório para quem passa na ilha.
O roteiro de São Miguel não foge aos seus locais icónicos: Sete Cidades, Lagoa do Fogo e Furnas. Mas gostaria de sublinhar alguns exemplos que os jornalistas do Público optaram por destacar, nomeadamente, a “nova cultura urbana” que se vive na ilha, na qual incluíram: o projecto “O Quarteirão”, com destaque para a “Miolo” de Vitor Marques e Mário Roberto, o “Rotas” de Catarina Ferreira, o “Estúdio” de Sara França e Fábio Oliveira ou a resiliente “Fonseca Macedo” de Fátima Mota.
Esta síntese actualizada da viagem que Raul Brandão fez em 1924, vem apenas reforçar a ideia de que a maior riqueza dos Açores está na sua enorme diversidade. Contudo, há quem continue a ignorar ostensivamente a realidade insular como um todo, promovendo questiúnculas indizíveis, na defesa de interesses particulares, mantendo uma visão (des)conhecida (ou mesmo antagónica e hostil) da ilha em frente.
Ao contrário do que temos ouvido por aí, e tal como escreve Paulo Simões: “o turismo não tem que - e não vai - crescer de forma igual em todas as ilhas. Simplesmente tal não é possível, haverá sempre ilhas mais procuradas do que outras”.
O desenvolvimento turístico passa por aquilo que já todos sabemos: a melhoria (substancial e qualitativa) dos nossos serviços, por uma oferta personalizada/diferenciada e pela preservação ambiental.
Esta é uma reflexão que urge realizar e que, paradoxalmente, teima em não acontecer.
* Publicado na edição de 30/05/16 do
AO
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