Após o período conturbado da história recente, o incremento turístico foi recebido como um milagre da multiplicação.
O fenómeno é global e alastrou-se, rapidamente, a todo o território. Os Açores não são excepção. Em particular, Ponta Delgada (e São Miguel).
Após anos ao abandono, assistimos a um crescente retorno do investimento (privado com recurso ao sistema de incentivos regional) ao centro histórico da maior cidade açoriana, com ênfase na restauração e no alojamento local.
Apesar da nossa (reduzida) escala, e da reconhecida diferença da pressão exercida em cidades como Lisboa e Porto, estamos a ser confrontados com os primeiros impactos da intensificação da actividade turística.
Ninguém dúvida da importância económica deste sector, sobretudo, no estímulo da reabilitação urbana e no maior dinamismo da construção civil.
No entanto, se em Lisboa se comparam preços do metro quadrado com Paris, nós, por cá, comparamos Ponta Delgada com a capital portuguesa, com a ressalva que a riqueza instalada não é equiparável.
Um dos aspectos mais visíveis, deste fenómeno, são os preços disponíveis para aquisição e arrendamento, que nos fazem questionar a quem se destinam aqueles imóveis. A prova é que alguns promotores imobiliários reconhecem (publicamente) que a sua carteira de clientes é, por estes dias, constituída por 50% de estrangeiros, com um poder de compra diferenciado e que fazem inflacionar, sobremaneira, o valor de mercado.
O centro histórico de Ponta Delgada está condenado, no futuro imediato, a ser habitado por turistas.
A discussão em torno da descaracterização das cidades, fruto da massificação do turismo, pode não ser (ainda) uma realidade a full-time mas terá (e já tem), inevitavelmente, efeitos na forma como acedemos à habitação em algumas zonas da cidade e da ilha.
Muito recentemente, a Secretaria Regional da Energia, Ambiente e Turismo implementou um registo mensal obrigatório, que visa monitorizar o número de hóspedes e dormidas no alojamento local, passando a fazer parte das estatísticas oficiais.
Mais do que a (importante) recolha de dados, para a monitorização da evolução desta forma de alojamento no sector turístico, considero importante o debate em torno do acesso acessível à habitação, na medida em que assistimos a um mimetismo empresarial em que, tudo e todos, parecem convergir para o mesmo.
E não é tudo bom, há muita oferta pouco qualificada que não dignifica o destino.
A euforia está aí mas importa, rapidamente, que se estabeleça uma regulação concreta que não penalize o investidor (mas o prevaricador do alojamento ilegal), mas cujo licenciamento não pode ser ilimitado e deverá responder a uma necessidade efectiva.
No caso da quebra da actividade turística (e consequentemente, de rendimentos), será que vamos assistir a um coro de indignados à procura de uma intervenção governamental que salve empresários e proprietários?
O passado (recente) é um bom exemplo daquilo que, de futuro, não devemos (ou devíamos) perpetuar.
Será que aprendemos a lição?
* Publicado na edição de 30/04/18 do Açoriano Oriental
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