quarta-feira, 19 de março de 2014

Um longo Inverno

O governo Passos/Portas diz aos portugueses para não entrar em “euforia” (!) quando, na prática, são os próprios que estão em êxtase e se desdobram em declarações e interpretações, umas mais fantasiosas do que outras, da realidade dos números.

A crueza do muito por que passa o país não importa e não é para aqui chamado. As dificuldades infligidas pela austeridade cega, o desemprego e as falências em catadupa são um peso a pagar pela “ilusão da prosperidade”, diz-nos a Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, que em entrevista à TVI deixa um aviso a este povo irresponsável e amoral: “as pessoas não podem ter a expectativa de voltar ao que era”.

O tom cândido e nada paternalista com que o Governo da República insiste em fustigar os contribuintes que os sustentam - em particular o sector público e os pensionistas, os que mais têm sofrido com o “custe o que custar” - parece não ter um fim à vista. Nas palavras contidas da Ministra das Finanças, que não se cansa de o dizer, “o caminho que falta fazer em termos de consolidação orçamental é longo e não me canso de repetir. É bom que as pessoas tenham essa consciência”.

Que consciência é esta de que nos fala a ministra? Terá ela consciência das contingências por que passam as pessoas? Haverá necessidade desta repreensão colectiva? E que consciência é que preside ao Conselho de Ministros?

Por estes dias a consciência que assiste a Maria Luís Albuquerque permite-lhe a afirmar coisas como “estamos a acelerar esse caminho sem acelerar os esforços”; ou “no final do programa teremos mais liberdade mas não liberdade plena”. Será que o governo está a tomar consciência das dificuldades que nos assistem ou repete-se até à exaustão na (vã) tentativa de se convencer que está no caminho certo?

O défice orçamental em 2013 andará à volta dos 5%, dentro dos limites definidos pelos credores internacionais e construído através dos "ganhos de eficiência do fisco" contra a evasão fiscal, do aumento das receitas do IRS e das receitas extraordinárias dos mais de 1277 milhões de euros arrecadados por intermédio do perdão fiscal. Mais extraordinário é o facto de se ter ficado a conhecer que, sem as medidas adicionais, o défice orçamental de 2013 teria registado um "excedente de 500 milhões de euros" face ao limite de 5,9% definido no segundo Orçamento Retificativo, apresentado em outubro. O que para a Maria Luís Albuquerque significa que "mesmo sem as medidas extraordinárias, teríamos cumprido o objetivo orçamental com que nos comprometemos no âmbito do programa".

Tenho alguma dificuldade em perceber esta ânsia de propagar a intensidade da austeridade como hoje a sentimos, sabendo de antemão que podíamos ter efectuado todo o ajustamento de redução da despesa pública de forma menos intensa e sem os enormes custos sociais que estamos a pagar.

Este é um governo que recusa a ideia de que há uma "enorme insensibilidade social" na prossecução deste plano. Contudo, a despesa com o rendimento mínimo, o complemento solidário para idosos, e muitas outras prestações sociais, desce. A repercussão social e económica desta missão é enorme e a recuperação da confiança dos portugueses no seu país e em quem os governa não se afigura tarefa fácil. Ou estaremos perante uma relação irremediavelmente perdida?

Enquanto isto, o governo Passos/Portas já sonha com sol e o calor de um Verão precoce e que está previsto chegar lá para Maio. O frio só agora começou e, por aquilo que nos dá a ver, o Inverno reserva-se-nos longo.


* Publicado na edição de 27/01/14 do AO
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segunda-feira, 10 de março de 2014

Vox populi

Angra do Heroísmo, Açores, Março 2014