À semelhança do que já acontece em Lisboa, e em muitas cidades europeias, Ponta Delgada avalia a criação de uma taxa turística.
Este anúncio vem contrariar a posição anteriormente assumida pelo autarca de Ponta Delgada, que recusou implementar a medida para não penalizar a “procura” do “destino turístico” no “primeiro ano de liberalização do espaço aéreo” (Lusa, 06/02/17).
Num primeiro momento, pareceu que Ponta Delgada iria seguir a opção do Porto, que é a delimitar “o crescimento desmesurado do turismo” (Renascença, 02/02/17). Mas será que é mesmo assim?
Os desígnios para esta tomada de decisão são vagos, expectáveis, é certo, mas sem grande fundamento. O que ficamos a saber é que está a ser “equacionada a criação em 2018 de uma taxa turística de um euro por dormida no concelho” considerada, agora, uma “vantagem para a economia dos Açores e de Ponta Delgada”.
Para além da intenção (e desta suposta vantagem económica), são reveladas “algumas conversações” - com a Câmara de Comércio e Indústria de Ponta Delgada e com a Associação de Hotelaria de Portugal, com a certeza de que “não há pressa na sua implementação”. Confesso a minha estupefacção perante um acto de consulta “sem pressas” mas que já tem estabelecido um prazo de validade. Aparentemente estamos apenas a cumprir um calendário pré-definido, para uma decisão que já está tomada e cujo prazo de implementação está decidido.
Nestes últimos quatro anos, este ziguezaguear do não compromisso ou de um compromisso que o é sem o ser, tem sido apanágio da governação municipal de Ponta Delgada, cuja acção tem primado pela ausência de um projecto coerente (e não contabilizo a ideia peregrina da candidatura a Capital Europeia da Cultura de 2027, estabelecido como objectivo (!) do concelho no seu Plano Estratégico de Desenvolvimento).
Nestes últimos dois anos, e perante o aumento vertiginoso de visitantes no concelho e na ilha, considero plausível que seja reflectida a introdução de uma medida desta natureza, desde que seja, amplamente, justificada e discutida. O que me parece não ser o caso, carecendo esta intenção de uma ampla reflexão e ponderação.
Considero que, mesmo antes de sabermos aquilo que queremos, temos estabelecido um valor de referência (€1, o mesmo de Lisboa?) e que a introdução desta taxa tem como ideia basilar, pasmemos, uma “forma de (arrecadar) receita” e que a mesma poderá significar para os cofres do município cerca de “meio milhão de euros”. Contudo, não nos é revelado a forma de cálculo, nem os números que consubstanciam este resultado.
Existem diversos equívocos nesta abordagem, reveladores da falta de estratégia (comum) para a promoção do destino Açores e da própria ilha de São Miguel. Cada concelho/ilha promove o seu território per si, desagregado dos restantes, em que cada qual tenta rivalizar, o mesmo espaço, com o seu congénere, sem perceber que, nesta disputa, ficamos todos a perder. A participação dos Açores na BTL - Bolsa de Turismo dos Açores é disso um bom (mau) exemplo daquilo que não devíamos perpetuar. E não é preciso ir muito longe para ter uma boa referência, basta olharmos para a representação do arquipélago da Madeira e para o orgulho que ostenta na promoção da sua identidade (unitária).
Ponta Delgada é a principal porta de entrada do destino Açores, será que a criação desta taxa turística tem isto em consideração? Será que no espaço de um ano, podemos considerar o destino Açores (ou Ponta Delgada?) como consolidado? A taxação será extensível a todo o concelho, ao limite da zona urbana ou à ilha? Será aplicável a todos os visitantes: nacionais, internacionais e/ou regionais?
Paradoxalmente, fica a ideia de que esta taxa visa arrecadar receita para fazer algo que já devia estar feito, sem que se reconheça, ou sejam identificadas, prioridades na sua utilização que não, somente, a de suportar a despesa corrente.
Antes de terminar, volto ao início deste texto. Que razões estão na génese desta tomada de decisão? E perante a: “turistificação da cidade” (Público, 10/02/17); a profusão descontrolada e desordenada, pelo concelho e cidade, de unidades de alojamento local; a crescente especulação imobiliária e a continuada desertificação do centro histórico - onde está a preocupação do município pelo equilíbrio saudável entre o turismo e aqueles que habitam, ou pretendem habitar, a cidade?
Temo que não haja uma resposta (consistente) para esta questão. A (futura) taxa limitar-se-á a preencher o vazio.
* Publicado na edição de 13/02/17 do AO
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