terça-feira, 11 de julho de 2017

Exiguidade(s)

O presente ano prova que as autarquias pouco, ou nada, aprenderam com a crise.
Na maior parte do tempo, o calendário e o investimento associado à cultura é apenas uma questão simbólica, feita de boa(s) vontade(s), diplomas de reconhecimento municipal, discursos, medalhas e placas comemorativas. Mas, em concreto, pouco investimento e nenhuma estratégia ou planeamento.
A justificação para esta precariedade, é de que existem, sempre, áreas prioritárias (!). A cultura é, habitualmente, referência obrigatória em discursos e acções evocativas.
Nestes dias de crise, ou de menor intensidade crítica, que na prática significam menor disponibilidade orçamental, a política cultural autárquica extingue-se na atribuição de valores monetários (simbólicos) a entidades culturais e ao discurso de circunstância.
Contudo, em ano eleitoral parece existir, quase sempre, outra disponibilidade no fundo do baú, para acudir as festas concelhias que marcam, indubitavelmente, o cartaz estival do arquipélago.
Outrora, estas festividades assentavam noutros pressupostos. Agora, passaram a designar-se, pomposamente, festivais, sem que ninguém questione o porquê desta mutação.
Nestes actos, a identidade cultural e a perpetuação da tradição passaram a ter na animação turística, e na oportunidade de negócio, a justificação para a sua realização.
Por estes dias, o turismo justifica, sem grande discernimento, quase toda a nossa acção pública e privada.
Esta semana, numa iniciativa da Confederação do Turismo Português, ouvi da boca de um profissional da PWC (PricewaterhouseCoopers), em relação à evolução (recente) do turismo dos Açores, que “depois do sol vem a chuva”. O director deste jornal escreveu, no seu editorial da semana passada, que o Plano Estratégico Turístico de Ponta Delgada, apresentado em final de mandato, “limita-se, em boa medida, a propor o óbvio”. Estas declarações acabam, no final, por ser a prova de como na teoria concebemos uma coisa e, na prática, acabamos a fazer outra.
Isto não é, apenas, apanágio de Ponta Delgada. Aqui terá, porventura, outra escala, relativamente à maior cidade dos Açores, e a este estafado slogan, cheio de pretensão e vazio de conteúdo.
O calendário de eventos do próximo fim-de-semana, na ilha de São Miguel, confirma que não existe qualquer tipo de planificação, no agendamento deste tipo de eventos nos Açores, numa região onde os turistas apontam como insuficiente, ou inexistente, a animação turística que lhes é proposta (convinha reflectir seriamente sobre o que isto significa).
Existem largos períodos do ano onde não acontece rigorosamente nada, para depois se realizar um conjunto infindável de iniciativas, dirigidas maioritariamente aos residentes, mas divulgadas como cartaz turístico (para aqueles que nos visitam).
Convém não ignorar outro factor, os residentes passaram a viajar com maior frequência, na procura, por exemplo, dos Festivais com f maiúsculo. Um movimento que não deve ser olhado de forma despiciente.
Quem nos procura não vem atrás de animação nocturna, ruído e lixo, procura a tranquilidade, segurança e a preservação ambiental que já não encontra noutras paragens. Aquilo que, na essência, afirmamos (de)ter mas que nos custa concretizar na sua real plenitude.
Para vos dar conta desta aparente esquizofrenia, deixo-vos aqui os eventos mais significativos do próximo fim-de-semana (14, 15 e 16 de julho): Música no Colégio (Ponta Delgada), Festival Walk & Talk (com sede em Ponta Delgada mas com reflexo em vários pontos da ilha de São Miguel), Festival Ilhas de Bruma (Ponta Delgada, Praia do Pópulo), Festa do Baleeiro - São Vicente Ferreira, Feira Quinhentista (Ribeira Grande), Festas do Nordeste e ainda, com a participação de muitos micaelenses, o Santa Maria Blues.
Se se tratassem de iniciativas sem recurso a fundos públicos, não tinha nada a opor. Como não são, a reflexão impõe-se. É tempo de repensar e redefinir os apoios públicos associados à chamada animação turística (e não cultural, convém não confundir uma coisa com a outra).
A excelência e a exuberância ambiental do destino Açores não pode ser fruto do acaso, nem pode ser compaginável com a promoção da mediocridade, nem da falta de articulação programática.
A exiguidade dos recursos (disponíveis) assim o exige.

* Publicado na edição de 10/07/17 do AO
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quarta-feira, 21 de junho de 2017

Olhar para dentro (da caixa)

A 25 e 26 de Maio os Açores foram palco da 35ª Conferência anual da Associação Europeia de Televisões Regionais (CIRCOM). A organização da edição 2017 esteve a cargo da RTP que propôs que a mesma se realizasse nos Açores, uma proposta bem acolhida e que contou, desde o primeiro momento, com o apoio incondicional do governo regional.

Durante estes dias, cerca de 200 profissionais de 32 países europeus marcaram presença, contribuindo directa (e indirectamente) para uma maior notoriedade do arquipélago fora de portas.

O tema da conferência deste ano - “Regional TV facing new screens” - surge num momento decisivo de afirmação do jornalismo em todo o mundo, face às mudanças tecnológicas operadas no tempo presente e que revolucionaram os media, a visão sobre o trabalho dos jornalistas, das empresas de comunicação social e, inclusive, a forma como interagimos (espectadores/consumidores) com os novos ecrãs (new screens).

Este terá sido, porventura, uma oportunidade (sem paralelo) para os profissionais da RTP/A, co-organizadores do evento, auscultarem os seus congéneres europeus, de realidades diferentes mas com as mesmas dúvidas (e incertezas) com que se confronta o serviço público de rádio e televisão nos Açores.

É urgente um estudo de audiências e um amplo debate público (e interno) sobre aquilo que é, e deve ser, a RTP/A do futuro. Os desafios são múltiplos e não se cingem à escassez de recursos técnicos (e humanos). Esta será, apenas, uma parte (substancial) do problema. 

Perante as questões que se levantam na missão a desempenhar pela RTP/A, entrincheirada num confronto entre o global e o local, num universo cada vez mais globalizado (e homogéneo), José Lopes de Araújo, vice-presidente do CIRCOM e antigo director da RTPA, afirmou, em entrevista ao Açores 24 (23 maio), algo que me parece óbvio: “É uma coisa terrível quando as pessoas pensam que a história se pode repetir. As coisas têm um tempo. Agora há desafios igualmente importantes. (…) É preciso ousar, não ter medo, é preciso fazer”.

Os novos media, catapultados pelo efeito de individualização/personalização do consumo de produtos culturais, informação e de entretenimento, disponíveis para uma ampla audiência, por intermédio das plataformas móveis, são algo que não podemos ignorar.

Nos Açores, os consumidores também acompanharam as evoluções tecnológicas e passaram a ter o mundo na palma da mão. Longe vai o tempo em que tinham acesso, exclusivamente, a um único canal de rádio e de televisão.

O efeito é disruptivo, sem dúvida. No entanto, persiste a ideia, em alguns círculos da RTP/A, e não só, de que nada deva ser alterado, que o mundo continua o mesmo e o que foi realizado no passado, é válido no presente (futuro). Persistir no erro poderá conduzir o destino - do serviço de rádio e televisão nos Açores - a um ponto sem retorno. Daí que importa sublinhar (a bold) o que disse (e fez questão de enfatizar) Lopes de Araújo.

Não defendo um modelo comercial (e indiferenciado), que não olhe as especificidades locais e a identidade que, ainda, justifica a existência de um canal regional com sede nos Açores. Não podemos ignorar, isso sim, a necessidade imperiosa na renovação (e actualização) dos conteúdos. E, interiorizar, que o serviço público não vive da memória (e da repetição até à exaustão) do seu passado.

E o financiamento, a Região terá capacidade para suportar a RTP/A? Não sei responder a esta questão. Mas mesmo que tenha, considero que esta função deve ser assegurada pela RTP, na disponibilização de um serviço público (do Estado), a par de tantos outros que existem nos Açores.

Para tal, e parafraseando Pierre Bourdieu (in ‘Sobre a Televisão’, Celta, 1997): “Para superarmos a dificuldade, é preciso que os (…) que estão na sua pequena fortaleza saibam sair dela e lutar, colectivamente (…).” 

Sem um colectivo, sem uma equipa coesa e motivada, será mais difícil superar o caminho que há a percorrer. Hoje, mais do que em qualquer outra altura, é necessário olhar para dentro (da caixa) e saber ousar.

* Publicado na edição de 19/06/17 do AO
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quarta-feira, 31 de maio de 2017

Barracada

Ponta Delgada é palco para a maior festa religiosa dos Açores: o Senhor Santo Cristo dos Milagres.
Esta imensa manifestação de religiosidade popular renova-se a cada ano que passa, protagonizada por milhares de fiéis e peregrinos que se deslocam ao Convento da Esperança, junto ao Campo de São Francisco.
A sua popularidade está mais enraizada entre nós, e na comunidade açoriana emigrada, mas congrega cada vez mais devotos que, por agora, se desloca em maior número ao arquipélago.
A taxa de ocupação das unidades hoteleiras é sempre elevada durante os dias da festa e, este ano, terá ficado próximo dos 100%. A somar a este valor, temos de contabilizar toda a nova oferta associada ao Alojamento Local (AL), cuja repercussão vai muito para além dos números oficiais.
A romaria a Ponta Delgada é intensa e não está circunscrita ao lado poente da cidade. A sua realização afecta toda a dinâmica da população que aqui habita e trabalha, nomeadamente, na gestão do trânsito e na salubridade do espaço público.
Contudo, este não parece ser o entendimento de quem gere os destinos do município. Esta não é uma situação nova, repete-se ano após ano, pelo que importa repensar, de forma responsável, toda a componente profana associada a esta grande festa.
O aparente desleixo na gestão do espaço público, de uma cidade como Ponta Delgada, não é compaginável com a imagem de sustentabilidade ambiental e de respeito pelo património que apregoamos (de)ter.
Perante alguns comportamentos e cenários menos aprazíveis, fingimos que não é nada connosco. Mas é. Basta ouvir os comentários e o olhar incrédulo de quem nos visita. Será esta a “diferenciação” de que se fala?
Vamos a exemplos. Não existe nenhum plano que regule o enorme fluxo de veículos ao centro histórico, com todos os constrangimentos que daí advêm: em que a falta de estacionamento alternativo conduz, inevitavelmente, ao parqueamento selvagem, sem respeito por quem tem problemas de mobilidade ou tenha um carrinho de bebé; a informação das alterações do trânsito automóvel não pode estar circunscrita a um edital (publicado numa página interior de um jornal que ninguém tem acesso), tem de existir uma acção pró-activa e pedagógica; e falta uma correcta sinalização e acompanhamento permanente na gestão do trânsito.
O caos parece ser o denominador comum. A proliferação de lixo e a localização/organização da zona de restauração continuam a ser as chagas desta festa.
Se queremos turismo de qualidade, temos de inovar (e renovar) um conjunto de conceitos, transformando as chamadas “barraquinhas” num festival gastronómico, por exemplo, organizado num espaço condigno.
Absolutamente tenebroso, é o espaço onde estão localizadas as actividades lúdicas, local para onde confluem, sobretudo, famílias.
A somar a tudo isto temos os inefáveis sanitários, em maior número, é certo, mas colocados, indiscriminadamente, em plena via pública, uns, inclusive, em frente ao forte de São Brás. Indescritível.
Nunca compreendi a razão pela qual não foram previstas infraestruturas de apoio, a esta grande festa e ao acolhimento de peregrinos, a quando das obras de requalificação do Campo de São Francisco. Uma situação que podia (e devia) ser solucionada em definitivo.
A somar a tudo isto temos, ainda, o triste espectáculo da venda ambulante no passeio da avenida marginal e das festas autorizadas, em pleno centro da cidade, até às seis da manhã.
Tenho consciência das dificuldades inerentes à articulação das várias entidades envolvidas na organização das festas do Senhor Santo Cristo. Mas a responsabilidade maior, desta tarefa, cabe ao município. Aqui não vale encolher os ombros, apontar o dedo à falta de civismo da população ou, simplesmente, “play dead”. Isto será sempre o mais fácil.
Por estes dias, o cosmopolitismo do município de Ponta Delgada rima com Barracada.

* Publicado na edição de 29/05/17 do AO
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terça-feira, 9 de maio de 2017

Na periferia (da Periférica)

Participei na Periférica, um seminário promovido pelo Walk & Talk, enquadrado no Programa de Conhecimento do Festival, que visou discutir a “Programação Cultural” o seu “âmbito, escala e relevância”.
Esta iniciativa antecede a realização do festival (que se realiza no mês de Julho) e é uma chamada de atenção para a necessidade, premente, entre nós, de uma reflexão crítica em torno da criação artística contemporânea.
O seminário contou com a participação de oradores locais, nacionais e internacionais, cada qual com uma perspectiva pessoal mas com muitos pontos em comum, demasiados até, quando se olha para as geografias envolvidas.
Parece-me relevante que o Walk & Talk procure marcar uma presença no calendário para além do tempo de realização do Festival, propriamente dito, e desta forma, procure disseminar a discussão, a reflexão com quem aqui trabalha todo o ano, através do paralelo com exemplos de latitudes distantes da nossa, cuja proximidade encontramos nos objectivos e na missão em que procuram trabalhar.
A partilha de experiências e de conhecimento são importantes para o desenvolvimento de novas competências e serve como elemento comparativo, numa análise crítica ao trabalho de cada um. Muitas vezes serve apenas para comprovar que as práticas vigentes são semelhantes em quase todos os locais, alterando-se, como é óbvio, mediante questões de “âmbito, escala e relevância”.
Este exemplo evidencia, a par de outras iniciativas que se têm desenvolvido no nosso meio cultural, a importância de não perdermos o contacto com a realidade que nos rodeia, sendo que é para ela que, numa primeira instância, o nosso trabalho se confronta, para depois ganhar outra relevância quando confrontada, num plano posterior, noutro âmbito.
Para que tal aconteça, importa, acima de tudo, ter presente e conhecer, com rigor, as condições de trabalho dos artistas/criadores regionais a uma escala que é nossa.
Considero erróneo, e desajustado, fixar pontos de comparação com realidades que distam, em quase tudo, da nossa. Não quero dizer que não devamos olhar para os bons exemplos que daí advêm. Aliás, o que me parece fundamental, é saber aplicar, à escada e ao contexto da(s) ilha(s), modelos de criação, fruição e de gestão que sirvam de referência ao desenvolvimento do tecido criativo regional.
Neste sentido, é importante investir em iniciativas que façam a ponte entre quem aqui trabalha e que, no âmbito de uma residência artística, um workshop, uma formação técnica, ou simples conferência, partilhe conhecimento com quem está mais longe dos centros, onde este tipo de experiências é mais regular, está disseminada de forma mais abrangente, e não se encontra reduzido a uma cadência pontual e para um público circunscrito, como é o nosso caso.
Deste modo, é necessário amplificar os círculos, deste conhecimento, a um público cada vez mais alargado, e não apenas afunilar este capital para um público que já o detém. Não pretendo excluir ninguém, parece-me importante, no que à relevância diz respeito, que consigamos contaminar, pela acção cultural que desenvolvemos, um cada vez maior número de participantes, em particular, aqueles que ainda não são consumidores regulares de produtos culturais.
Para tal, importa apostar num trabalho de mediação de públicos, trabalhando em estreita parceria com as escolas e outras entidades formativas, na medida em que “uma comunidade emancipada é uma comunidade de contadores e tradutores” (Jacques Rancière, 2010).
A periferia que aqui se vive é tanto geográfica, como cultural. Iniciativas como esta visam tornar este caminho mais acessível, sendo que ele não óbvio para uma imensa maioria.
No final, a programação cultural tem de encontrar a escala adequada sem dispensar de “sentir o espírito do tempo” (António Pinto Ribeiro, 2009), sem pretender ser aquilo que não é (ou o que somos) mas apontando, sempre, pistas de futuro (progresso).
A Periferia está, na maioria dos casos, no meio de nós.

* Publicado na edição de 08/05/17 do AO
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segunda-feira, 1 de maio de 2017

Álvaro Dâmaso já não é candidato à Câmara de Ponta Delgada

Álvaro Dâmaso era o candidato (independente) do PSD à CMPDL? Ou o líder do PSD passou a ser o porta-voz de uma candidatura que não passou de um anúncio?

quarta-feira, 1 de março de 2017

Vertigem sedentária

Passamos os últimos anos com o défice na boca, mas quando atingimos o menor valor das últimas quatro décadas, pareceu, de facto, que houve mais vida para além disso.
A rapidez com que a volatilidade da agenda consome o espaço mediático transforma toda a matéria num dado superficial ou, como que agora se diz, em factos alternativos.
O universo político, do parlamento, das comissões, dos gabinetes, dos assessores, dos jornalistas, dos comentadores, interligado com as “forças vivas” da sociedade civil, consubstanciados por conselhos de ilha, associações empresariais, ordens profissionais, sindicados, e muitas outras representações, alimentam-se de um debate em ‘loop’, realizado vezes sem conta e em circuito demasiado fechado, distante do real e das pessoas.
Para Rui Tavares (Público, 17/01/17), “o que os nossos debates revelam é que Portugal é um problema político no sentido de não termos constituído uma sociedade que saiba deliberar em conjunto com qualidade e responsabilização, o que, por sua vez, ocorre em primeiro lugar por causa do enquistamento da classe partidária nacional e da enormíssima preguiça dos seus atores, habituados que estão a fazer política quotidiana sempre da mesma forma: fechados no Parlamento e virados para as televisões.”
A equidistância entre um tempo e o outro funciona por oposição, em que a compatibilidade de um não tem o mesmo significado, e aplicabilidade, do outro.
As naturais expectativas das populações esbarram, ingenuamente, no tempo regimental e na publicação legislativa, cuja concretização cumpre a imperceptibilidade do preâmbulo.
Cumprimos um tempo difuso, desacreditado, dessacralizado, extremo, excessivo, fanático e propenso a ismos.
Entre cá e lá: um ex-Presidente da República intenta um ajuste de contas e a (re)posição da realidade tal como ele a compreende; um Ministro dos Negócios Estrangeiros diz o dito por não dito e coloca em causa um documento oficial (e fragiliza a sua imagem pública e a sintonia institucional intergovernamental); num período de enorme fragilidade económica e social para as famílias e para o país, ficamos agora a saber que 10 mil milhões de euros foram transferidos para offshores, entre 2011/2014, sem fiscalização por parte da Autoridade Tributária (e perante a incredulidade dos portugueses); o debate sobre o processo de incineração em São Miguel promete continuar a incendiar e a dividir opiniões, e não me parece que haja nada a ganhar com o extremar de posições, sendo que esta é uma decisão demasiado séria para ser ignorada e desvalorizada por quem tem responsabilidades na sua resolução.
Mesmo à distância, mas aqui tão perto, Onésimo Teotónio de Almeida (Visão, 18/02/17) lê com grande acutilância aquilo que somos: “Nos EUA vejo muito mais enraizada a atitude de comprometimento: há algo que depende também de mim e eu terei de ser o primeiro a empenhar-me em mudar. As pessoas que apenas criticam acabam não sendo ouvidas. Quem abre a boca sem dar primeiro o exemplo da ação positiva é considerado um fala-barato. Está vulgarizada a crença de que as obras falam mais alto que as palavras. Em Portugal palramos de mais e agimos de menos. Culpar os outros é sempre uma saída fácil para a nossa sedentária inação.” Não podia estar mais de acordo.
A indignação entre eleitos e eleitores (instituições/população) passou a ser uma constante, na medida em que perpassa na sociedade da hiper-realidade um clima de suspeição permanente, gerador de tensão na timelime, ávida do vazio da novidade.
Parafraseando Byung-Chul Han na sua obra seminal ‘No Exame’ (Relógio D’ Água, 2016): “A sociedade da indignação é uma sociedade do escândalo. É desprovida de firmeza, de contenção. A rebeldia, a histeria e a obstinação peculiares das ondas da indignação não permitem qualquer comunicação discreta e objectiva, qualquer diálogo, qualquer debate. (…) A atual multidão indignada é extremamente fugaz e dispersa. Falta-lhe por completo a massa, a gravidade, necessária à ação. Não engendra qualquer futuro.”
O fim da História não se escreveu, altera-se a uma velocidade vertiginosa, e a incerteza passou a ser o garante do (nosso) futuro.

* Publicado na edição de 27/02/17 do AO
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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Preencher o vazio

À semelhança do que já acontece em Lisboa, e em muitas cidades europeias, Ponta Delgada avalia a criação de uma taxa turística.

Este anúncio vem contrariar a posição anteriormente assumida pelo autarca de Ponta Delgada, que recusou implementar a medida para não penalizar a “procura” do “destino turístico” no “primeiro ano de liberalização do espaço aéreo” (Lusa, 06/02/17).

Num primeiro momento, pareceu que Ponta Delgada iria seguir a opção do Porto, que é a delimitar “o crescimento desmesurado do turismo” (Renascença, 02/02/17). Mas será que é mesmo assim?

Os desígnios para esta tomada de decisão são vagos, expectáveis, é certo, mas sem grande fundamento. O que ficamos a saber é que está a ser “equacionada a criação em 2018 de uma taxa turística de um euro por dormida no concelho” considerada, agora, uma “vantagem para a economia dos Açores e de Ponta Delgada”.

Para além da intenção (e desta suposta vantagem económica), são reveladas “algumas conversações” - com a Câmara de Comércio e Indústria de Ponta Delgada e com a Associação de Hotelaria de Portugal, com a certeza de que “não há pressa na sua implementação”. Confesso a minha estupefacção perante um acto de consulta “sem pressas” mas que já tem estabelecido um prazo de validade. Aparentemente estamos apenas a cumprir um calendário pré-definido, para uma decisão que já está tomada e cujo prazo de implementação está decidido.

Nestes últimos quatro anos, este ziguezaguear do não compromisso ou de um compromisso que o é sem o ser, tem sido apanágio da governação municipal de Ponta Delgada, cuja acção tem primado pela ausência de um projecto coerente (e não contabilizo a ideia peregrina da candidatura a Capital Europeia da Cultura de 2027, estabelecido como objectivo (!) do concelho no seu Plano Estratégico de Desenvolvimento).

Nestes últimos dois anos, e perante o aumento vertiginoso de visitantes no concelho e na ilha, considero plausível que seja reflectida a introdução de uma medida desta natureza, desde que seja, amplamente, justificada e discutida. O que me parece não ser o caso, carecendo esta intenção de uma ampla reflexão e ponderação.

Considero que, mesmo antes de sabermos aquilo que queremos, temos estabelecido um valor de referência (€1, o mesmo de Lisboa?) e que a introdução desta taxa tem como ideia basilar, pasmemos, uma “forma de (arrecadar) receita” e que a mesma poderá significar para os cofres do município cerca de “meio milhão de euros”. Contudo, não nos é revelado a forma de cálculo, nem os números que consubstanciam este resultado.

Existem diversos equívocos nesta abordagem, reveladores da falta de estratégia (comum) para a promoção do destino Açores e da própria ilha de São Miguel. Cada concelho/ilha promove o seu território per si, desagregado dos restantes, em que cada qual tenta rivalizar, o mesmo espaço, com o seu congénere, sem perceber que, nesta disputa, ficamos todos a perder. A participação dos Açores na BTL - Bolsa de Turismo dos Açores é disso um bom (mau) exemplo daquilo que não devíamos perpetuar. E não é preciso ir muito longe para ter uma boa referência, basta olharmos para a representação do arquipélago da Madeira e para o orgulho que ostenta na promoção da sua identidade (unitária).

Ponta Delgada é a principal porta de entrada do destino Açores, será que a criação desta taxa turística tem isto em consideração? Será que no espaço de um ano, podemos considerar o destino Açores (ou Ponta Delgada?) como consolidado? A taxação será extensível a todo o concelho, ao limite da zona urbana ou à ilha? Será aplicável a todos os visitantes: nacionais, internacionais e/ou regionais?

Paradoxalmente, fica a ideia de que esta taxa visa arrecadar receita para fazer algo que já devia estar feito, sem que se reconheça, ou sejam identificadas, prioridades na sua utilização que não, somente, a de suportar a despesa corrente.

Antes de terminar, volto ao início deste texto. Que razões estão na génese desta tomada de decisão? E perante a: “turistificação da cidade” (Público, 10/02/17); a profusão descontrolada e desordenada, pelo concelho e cidade, de unidades de alojamento local; a crescente especulação imobiliária e a continuada desertificação do centro histórico - onde está a preocupação do município pelo equilíbrio saudável entre o turismo e aqueles que habitam, ou pretendem habitar, a cidade?

Temo que não haja uma resposta (consistente) para esta questão. A (futura) taxa limitar-se-á a preencher o vazio.

* Publicado na edição de 13/02/17 do AO
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sábado, 21 de janeiro de 2017

A bem da Democracia

O ano parlamentar promete arrancar com uma (nova) e inusitada polémica.

O adiamento da reunião parlamentar proposta pela Presidente da Assembleia resultante do luto nacional decretado após a morte do ex-Presidente da República Mário Soares, não prejudicou os trabalhos, nem a agenda. No entanto, compreendo que o mesmo possa ter sido um constrangimento na agenda pessoal e partidária.

Contudo, querer comparar o funeral de uma figura com a importância de Mário Soares, com outra situação equivalente que tenha ocorrido no passado, parece-me absurdo.

Para além disto, a posição assumida por alguns dos partidos pareceu querer desvalorizar o acto, nomeadamente, fazendo transparecer a ideia que se tratava de uma situação rotineira e que estaríamos perante, apenas, mais um ponto na agenda.

Ao invés de estarmos a discutir as razões que levaram ao adiamento da sessão plenária, não teria sido mais benéfico para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores ter tido uma representação parlamentar com todas as forças partidárias que a compõem, naquele que foi o primeiro funeral de uma personalidade desaparecida em democracia com direito a honras de Estado?

Num momento como este, com toda a carga simbólica que lhe está associada, lamento profundamente que os Açores possam ficar associados à morte de Mário Soares de forma negativa e que a mesma possa ser utilizada como arremesso político (e como forma de denegrir a Casa da Democracia Açoriana).

Não me parece que a mesma necessite de (mais) publicidade negativa.

Espero que os parlamentares, em particular, os líderes de cada representação ou grupo parlamentar, tenham consciência daquilo que está em jogo, nomeadamente, a homenagem a uma das figuras maiores do Portugal contemporâneo e de alguém que lutou para que a democracia, entre nós, fosse exercida em Liberdade.

Importa honrar a política com P maiúsculo e não entrar em jogos e artifícios que menorizam aquilo que é tido como fundamental para a nossa vida em comunidade.

Considero que esta situação deva servir como um momento de reflexão e como uma oportunidade para que, de uma vez por todas, os parlamentares sejam proactivos na revisão do regimento da Assembleia Legislativa Regional, a carecer de alterações desde 2008, altura em que a composição parlamentar passou a ser mais alargada.

Isto porque importa que o tempo do funcionamento parlamentar acompanhe o restante da nossa vida em sociedade, na rapidez e no imediatismo dos procedimentos, para o que mesmo não seja lido como anacrónico e formalista, num período em que tudo tende a ser mais acessível.

E para que o aparente distanciamento entre eleitos e eleitores seja clarificado, desmistificando o universo parlamentar/político como um mundo paralelo, uma bolha, longe da realidade que diz defender.

Aqui entram todas as formas de populismo, procurando no descontentamento e no descrédito popular a força que necessitam para fazer-se ouvir.

José Pacheco Pereira (Público, 07/01/17) tem reflectido amplamente sobre o que hoje se passa no debate público, no qual “as redes sociais, que, não sendo a causa do populismo, são um seu grande factor de crescimento e consolidação”. Do mesmo modo, refuta a ideia “de que são as novas tecnologias que estão a mudar a sociedade. É o contrário. É a mudança da sociedade que potencia o uso de determinadas tecnologias, que depois acentuam os efeitos de partida”. Não podia estar mais de acordo.

Não tenho a menor dúvida que todas estas questões contribuem para o desencanto popular em torno da actividade política mas não podemos medir a produtividade parlamentar pelo adiamento (extraordinário) de uma sessão plenária. Infelizmente, o escrutínio público, que vezes demais ignora o que se passa, é, no momento actual, implacável.

Espero, sinceramente, que esta polémica se dissipe, seja esclarecida no espaço próprio, e não sirva para arregimentar ódios incontidos.

No final, ninguém sairá a ganhar, apenas sei quem perde: a Assembleia Legislativa Regional (e todos nós). Espero que os senhores deputados tenham isto em atenção na semana que agora se inicia. A bem da democracia.


* Publicado na edição de 30/01/17 do AO
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sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Propostas (in)concretas





































Quando o populismo é quem mais ordena e passa a ser o denominador comum de toda a acção política de determinados partidos.

Os mesmos que depois vêm dizer que não querem que as pessoas se sintam 'deliberadamente enganadas' (entrevista ao líder do CDS/PP Açores no Açoriano Oriental de 29/09/2016).

Este candidato é um caso flagrante do "faz o que eu digo mas não faças o que eu faço".

E ainda há quem diga que esta campanha eleitoral anda monótona...

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Mais?





















Nos Açores, uma parte significativa da população continua a encarar o ambiente como um acessório prêt-à-porter.

Importa perceber que é no estrito cumprimento das normas e da monitorização permanente que está o futuro da nossa sustentabilidade colectiva.

* notícia de capa do jornal Açoriano Oriental de 03/08/2016

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Descubram as diferenças
















Vai uma grande diferença entre o falar e o fazer. As eleições regionais ficaram agendadas para o dia 16 de outubro.

A campanha já começou.

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Ilhas (des)conhecidas















O suplemento Fugas, publicado com a edição de sábado do jornal Público, deu uma Volta às Ilhas, num périplo contemporâneo pelos arquipélagos dos Açores e da Madeira, no ano em que se assinalam os 90 anos d’“As Ilhas Desconhecidas” de Raul Brandão.

Do Corvo a Santa Maria são sugeridos itinerários que revelam histórias, e lugares, uns mais familiares do que outros. Por exemplo, o Ecomuseu na ilha do Corvo, um projecto promovido pela Direcção Regional da Cultura, paradigma em curso de um trabalho construído com a comunidade, na medida em que se apresenta como um “museu vivo”, “dinâmico” e “sustentável”. Na ilha em frente, é-nos dado a saber a recuperação integral da Aldeia da Cuada, uma “ilha dentro da ilha” que revive um tempo que não este, e que faz as delícias dos viajantes que aportam às Flores.

Daqui passamos à Graciosa. Conhecida pelos seus burros, que agora não serão mais de 70, adoptados por um cenógrafo italiano que vive na ilha e que já trabalhou com realizadores de renome, como Martin Scorcese, Bernardo Bertolucci ou Frederico Fellini, cujo interesse na divulgação e preservação, desta espécie, levou a que a mesma tivesse sido reconhecida como raça autóctone. Já na Terceira, os nossos viajantes descobrem o Algar do Carvão, um local de visita obrigatória para quem queira saber o que se passa no coração da ilha e descobrir a beleza escondida no interior da terra.

Em São Jorge, numa visita obrigatória à Fajã do Santo Cristo e às amêijoas que se tornaram famosas, os jornalistas lançam um desabafo de quem fez o caminho a pé: “Pensamos com os nossos botões que, apesar do cenário idílico e quase irreal, deve ser preciso coragem para morar num lugar assim, inóspito, fora do tempo”. Esta, também, podia ser uma síntese do que é viver nos Açores. E, convenhamos, não é para qualquer um.

Dos trilhos pedestres, ao café da Fajã dos Vimes, ao queijo do Manuel Silveira e ao atum de Santa Catarina, atravessamos o canal para chegar ao Pico. Esta é uma das maiores riquezas do Grupo Central, a proximidade física e visual entre as ilhas, cuja potencialidade tem de ser mais rentabilizada. Mas, para que isso aconteça, são necessárias vontades que não apenas as oficiais.

Ao longo dos últimos anos, o Pico tem gerado um burburinho crescente. A imensidão da ilha contrasta com a baixa densidade populacional. O turismo em espaço rural é um dos seus maiores trunfos. E é, por aí, que deve caminhar o desenvolvimento turístico da ilha Montanha. A revitalização do sector vitivinícola e a classificação da Paisagem da Cultura da Vinha, pela Unesco, são activos importantíssimos, que devem ser mantidos e preservados a todo o custo. Todos estes factores, conjugados com um conjunto museológico exemplar, fazem com que se olhe para o Pico com um orgulho incontido.

Chegados à Horta, há mais do que o Peter’s e o seu gin. Destaque natural para o Jardim Botânico do Faial, onde são conservadas “sementes de todas as ilhas” e onde cabe “toda a flora endémica dos Açores”. Há tempo, ainda, para visitar o Vulcão dos Capelinhos, e o seu Centro Interpretativo, descobrir o artesanato com miolo de figueira e para uma saída de barco à procura de uma baleia-azul.

Chegados ao Grupo Oriental, começamos por Santa Maria, a primeira ilha a ser descoberta e a mais antiga do arquipélago. É isso, pelo menos, o que nos dizem os seus fósseis. O Barreiro da Faneca é, obviamente, um ponto de paragem obrigatório para quem passa na ilha.

O roteiro de São Miguel não foge aos seus locais icónicos: Sete Cidades, Lagoa do Fogo e Furnas. Mas gostaria de sublinhar alguns exemplos que os jornalistas do Público optaram por destacar, nomeadamente, a “nova cultura urbana” que se vive na ilha, na qual incluíram: o projecto “O Quarteirão”, com destaque para a “Miolo” de Vitor Marques e Mário Roberto, o “Rotas” de Catarina Ferreira, o “Estúdio” de Sara França e Fábio Oliveira ou a resiliente “Fonseca Macedo” de Fátima Mota.

Esta síntese actualizada da viagem que Raul Brandão fez em 1924, vem apenas reforçar a ideia de que a maior riqueza dos Açores está na sua enorme diversidade. Contudo, há quem continue a ignorar ostensivamente a realidade insular como um todo, promovendo questiúnculas indizíveis, na defesa de interesses particulares, mantendo uma visão (des)conhecida (ou mesmo antagónica e hostil) da ilha em frente.

Ao contrário do que temos ouvido por aí, e tal como escreve Paulo Simões: “o turismo não tem que - e não vai - crescer de forma igual em todas as ilhas. Simplesmente tal não é possível, haverá sempre ilhas mais procuradas do que outras”.

O desenvolvimento turístico passa por aquilo que já todos sabemos: a melhoria (substancial e qualitativa) dos nossos serviços, por uma oferta personalizada/diferenciada e pela preservação ambiental.

Esta é uma reflexão que urge realizar e que, paradoxalmente, teima em não acontecer.

* Publicado na edição de 30/05/16 do AO
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sexta-feira, 22 de abril de 2016

Virar a página: desafios da imprensa escrita num tempo digital

Os jornais estão hoje confrontados com desafios adicionais.

As novas tecnologias fizeram com que os meios tradicionais fossem engolidos pelo enorme fluxo informativo disponibilizado pelos ‘social media’.

Hoje a informação chega, em simultâneo, a mais pessoas e essa possibilidade passou a ser uma arma poderosa.

O impacto destes novos media no jornalismo mundial tem tido muito mais repercussões do que aquelas provocadas pela chegada do online.

Neste processo há um aparente paradoxo: se, por um lado, a “internet e as redes sociais permitem aos jornalistas fazer um trabalho poderoso”, por outro “contribuem para fazerem das edições de jornais em papel um investimento não-rentável” (Emily Bell, EJO 13/04/16).

Os custos destas organizações passaram a ser outros e a rentabilidade da publicidade passou a ser outra.

Este novo paradigma, que é transversal a vários sectores da economia e das sociedades contemporâneas, discorre a uma velocidade estonteante e as mudanças que provoca são implacáveis ante qualquer período de adaptação.

Andamos tão inebriados com as maravilhas que a tecnologia nos oferece que nem nos damos ao trabalho de nos questionar sobre como flui muita da informação que hoje chega até nós.

O poder das grandes empresas de ‘social media’ é cada vez maior e a competição entre os gigantes - Google, Facebook, Apple e Microsoft - pelo controle da informação, pela inovação tecnológica e pelo domínio das mais diversas plataformas digitais é feroz.

Passamos todos, sem excepção, mais tempo do que nunca focados nos nossos dispositivos móveis.

As inovações introduzidas fizeram dos ‘smartphones’ objectos muito mais sedutores que a televisão e as suas aplicações fazem do seu carácter utilitário uma verdadeira revolução ao nível comportamental, elevando o individualismo e a personalização a uma dimensão sem paralelo.

Perante toda uma nova categoria de signos, não é possível mantermo-nos alheados da transformação em curso.

Apesar de estarmos afastamos geograficamente dos grandes centros, estas alterações acontecem a um nível global. Aliás, a questão será precisamente essa: descentralizámos os outrora centros. Pelo que a afirmação da pertinência da imprensa escrita é, hoje, mais que nunca, absolutamente fundamental.

Nos Açores, naturalmente, não somos incólumes às mudanças operadas no sector da comunicação, onde importa reposicionar o tipo de jornalismo que se faz perante uma audiência cada vez mais atenta, mais instruída e mais exigente.

As dificuldades não são de agora, e parte desta batalha pelo acesso à informação se trava, talvez, noutro tabuleiro que não apenas o da impressa escrita.

A coexistência e a complementaridade entre ambos passou a ter diferentes leituras.

Este é também um caminho que o Açoriano Oriental tem e terá de fazer, neste e noutros aniversários.


Alexandre Pascoal
PCA Teatro Micaelense

* Texto publicado a 18/04/2016 na edição do 181º aniversário do Açoriano Oriental

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Um Amigo em Lisboa

António Costa, o novo Primeiro-Ministro, manifestou a sua vontade em reunir com os governos regionais dos Açores e da Madeira para “em diálogo (...) alcançar as soluções mais adequadas dentro daquilo que são os limites que os governos regionais e o Governo da República se confrontam”.

Este é, para já, um sinal positivo quanto à visão do país como um todo, contrariando o ostracismo centralista dos anteriores protagonistas.

E não considero, forçosamente, que venham a ser concedidas mais-valias aos Açores pela proximidade que agora temos com Lisboa. A preocupação que estará em cima da mesa na futura reunião com o Governo dos Açores, cuja disponibilidade já foi manifestada por Vasco Cordeiro, é que as especificidades do nosso arquipélago e as responsabilidades dos serviços da República na Região sejam salvaguardados - coisas que, num passado recente, foram deixadas ao abandono.

Mais do que exigir mais recursos da República (que sabemos de antemão ser matéria sensível e de difícil concretização por razões que me parecem óbvias), importa clarificar o posicionamento sobre questões fundamentais como a gestão do mar; da RTP-Açores; da Universidade dos Açores; ou do Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada, apenas para nomear alguns.

É curioso verificar que alguns temas que estiveram na gaveta nos últimos quatro anos sejam agora resgatados pelos deputados açorianos do PSD que, além de confortavelmente instalados na bancada da oposição, e acometidos pela maleita da identidade perdida, vestiram novamente a investidura da defesa dos interesses da Região.

Caberá, então, ao novo Governo resolver o que durante todo este tempo foi protelado. E não estou a contar que António Costa nos vá resolver todos os pendentes, mas sabemos, de antemão, que não irá fazer ouvidos de mercador e que existe uma predisposição para o diálogo. Nesta, como em outras situações, ajuda ter um amigo em Lisboa que não nos mande ir ao banco.

Museu Carlos Machado

O Museu Carlos Machado foi galardoado pelo Programa Ibermuseus, no âmbito do VI Prémio Ibero-Americano de Educação Museus, com o segundo lugar na categoria de projetos realizados e em curso com - “O Museu Móvel nas Sete Cidades – Um projeto em Andamento”. Esta é mais uma prova que o Museu Carlos Machado não está nem fechado, nem parado. Que a abertura do Pólo principal do Museu (prevista para o 2º semestre de 2016) é uma necessidade urgente e um constrangimento para actividade do Museu Carlos Machado, ninguém ignora e o seu Director é o primeiro a dizê-lo. Não obstante, afirmar que não se fez nada até aqui é de uma tremenda injustiça e uma completa inverdade. Muitos dos críticos que papagueiam por aí são precisamente aqueles que, por ignorância e mesquinhez, não participam, nem têm participado no trabalho inovador que tem sido feito por Duarte Melo e pelos seus colaboradores ao longo da última década. Pior do que falar, é ignorar e falar de um lugar de ignorância.

Prémio Medeiros Cabral

Tenho sempre um enorme pudor em falar de iniciativas que decorrem no Teatro Micaelense, mas, em relação ao Prémio Medeiros Cabral, não posso deixar de salientar o empenho das professoras Alexandra Baptista, Isabel Silva Melo e Paula Mota, da Escola Secundária Antero de Quental, no trabalho que desenvolveram junto dos seus alunos no âmbito da sua participação no concurso. O estímulo e a exposição das crianças e jovens à exploração criativa e artística é estruturante, assim como é o incentivo à sua participação. Com isto não quero dizer que venham a ser todos artistas.

Mas é por intermédio deste tipo de realizações que se desperta para a necessidade imperiosa de incutir a Cultura, nas suas mais diversas acepções, na formação destes alunos, para que sejam, nesta medida, mais capazes de integrar, intervir e compreender a sociedade em que se inserem. Fazê-los participar e fruir Cultura é também um desafio que se coloca ao Teatro Micaelense e foi nesta perspectiva que o mesmo se associou à Associação Seniores de São Miguel nesta iniciativa tão meritória.

Por último, queria deixar uma preocupação muitas vezes partilhada com o director deste jornal (e de outros meios de comunicação social): a urgência de existir alguém que faça de ‘mediador’ entre artistas e público, na medida em que tudo aquilo que hoje nos é dado a ver, ouvir e sentir, da fotografia, ao teatro, às artes plásticas e à música, não é tudo a mesma coisa, nem tem a mesma qualidade.

Por forma a atingirmos uma outra familiaridade com o objecto artístico, falta-nos o confronto com diferentes públicos e um momento (de reflexão) da(o) crítica(o).

* Publicado na edição de 07/12/15 do AO
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terça-feira, 20 de outubro de 2015

A direita está triste porque acabou o apartheid

Na campanha, foi dito e reiterado pelo PS que não se aliaria à direita, mas a direita quer precisamente isso e acha que o PS tem toda a legitimidade política para o fazer. Mas acha que o PS não tem legitimidade para se aliar à esquerda, sobre a qual o PS não deu nenhuma garantia semelhante. A existência de dois pesos e duas medidas na direita portuguesa é por de mais gritante e essa é uma das razões por que precisamos mesmo de correr com esta gente do poder.
Leituras para um novo estado de coisas.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

O dia seguinte


segunda-feira, 28 de setembro de 2015

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Ilusões

A terminar o primeiro mês de Agosto sob a influência do acréscimo turístico por via das companhias de baixo custo, já teremos todos dado nota das evidentes diferenças do ‘antes’ e do ‘depois’.

A época alta ainda não terminou e só depois de disponibilizados os números é que podemos aferir com rigor o real impacto destes novos fluxos turísticos.

Contudo, e de forma empírica, é visível o impacto nos serviços e na circulação de pessoas e veículos nas ruas e trilhos destas ilhas.

E nem tudo está, ou estava, de todo preparado para responder a mais solicitações, sejam horários de serviços, seja a recolha de lixo (Ponta Delgada é disso um péssimo exemplo) ou mesmo uma simples resposta em inglês.

Os dados são positivos, a economia agita-se mas não está tudo feito. Havia alguma desconfiança por parte dos empresários e a prova é que há muito por fazer. Não nos iludamos.

Receio alguma euforia incontida e investimentos reactivos, pouco ou nada estruturados, num local pródigo em clonagem - onde abre uma mercearia, abrem logo duas ou três, todas num raio de cinquenta metros. E depois? E depois, apela-se ao governo a ver se alguém nos dá a mão.

Não faltam notícias e reportagens a medir o grau de satisfação de quem nos visita, alguns dos quais são meros exercícios contorcionistas para preencher o vazio daquilo a que se designou “silly season”.

E ela tem estado aí com alguns dos candidatos regionais às eleições legislativas a percorrer as várias ilhas do arquipélago, alguns por vocação, outros por vicissitudes partidárias.

A campanha eleitoral nacional anda em estado letárgico e discute-se tudo menos aquilo que importa. Ninguém parece muito interessado em discutir matérias fundamentais e andamos entretidos, com a preciosa ajuda dos media, com cartazes e debates, descurando completamente o conteúdo.

A coligação que (des)governa o país reproduz uma narrativa infantil que varia entre os bons e os maus e o regresso do bicho-papão. Também aqui não nos iludamos: é eficaz.

O Partido Socialista, como alternativa de poder que é, tem de deixar a opacidade, tem de falar olhos nos olhos dos portugueses e deixar-se de estratégias e campanhas de engano à semelhança do que faz a coligação. Vivemos um tempo de excepção e há, felizmente, vida para além dos sound bites.

A ilustrar o que aqui digo, por estes dias ouvi a cabeça de lista da coligação - que nos Açores não está coligada mas que estará, de futuro, na Assembleia da Republica - pronunciar-se sobre a venda do edifício do antigo Emissor Regional dos Açores com a seguinte preciosidade: “Berta Cabral salientou que o edifício é importante para a memória da rádio pública no arquipélago e deve ser preservado, cabendo essa função às instituições públicas com responsabilidade a nível cultural na Região” (Jornal Terra Nostra, 24/08/15).

Para alguém que, no passado recente, defendeu que a gestão da RTP-Açores devia ser entregue a privados, não deixa de ser curioso que agora venha defender que seja o Governo Regional a gerir um ‘Museu da Rádio’.

Este acto é revelador do que tem sido a política deste Governo da República na sua relação com os Açores, a de suprimir recursos financeiros e a de lhe conferir responsabilidades sem o correspondente cabimento orçamental.

Além de constituir-se como uma declaração de uma inqualificável desfaçatez, a mesma revela que a coligação tem na sua representante alguém que menoriza os órgãos de governo próprio dos Açores num exercício de pura desresponsabilização por quem tutela a RTP, na fuga às suas responsabilidades e que, por princípio, devia ter acautelado o valor simbólico associado à memória da RDP e que, simplesmente, não o fez.

A confiança não se escreve, conquista-se.

* Publicado na edição de 31/08/15 do AO
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segunda-feira, 20 de julho de 2015

Um 'driving range' que nunca o foi

Parque urbano, Ponta Delgada, Julho' 2015

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Diz que é uma espécie de...rumo

A minha leitura da semana com destaque para o rumo que tem sido traçado para ‪a cidade de Ponta Delgada.

terça-feira, 28 de abril de 2015

Coisas que não se explicam






















Portas da Cidade, Ponta Delgada, 26/04/15.

domingo, 8 de março de 2015

Espírito aberto





















Para conferir aqui.

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Com gado, isto corria melhor *

* in Expresso, 01.11.14





















Mais sobre Passos Coelho e a sua assessora aqui.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Frases da semana





















Edição de domingo do Açoriano Oriental.

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

A culpa é do governo












Notícia hoje com o Açoriano Oriental.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

transeatlântico





















Lançar uma revista literária nos Açores é um acto corajoso e contracorrente nos tempos que correm.

A transeatlântico foi lançada ontem no Instituto Cultural de Ponta Delgada na presença de amigos e colaboradores.

O design é limpo para aquilo que se pratica entre nós e a plêiade de textos revela arejamento nos temas e nos nomes convidados a participar neste número 0.

A periodicidade pretende ser anual, a distribuição é nacional e tem um preço acessível (pvp €10).

Para mais informações dêem um salto até à Companhia das Ilhas.

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Entrevista
















Na edição de 29.08.14 do Açoriano Oriental.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

O D-Day foi há 70 anos

Fotografia Life Magazine
Numa Europa plena de contradições, e com lapsos de memória, importa celebrar datas como esta para que o passado não possa, nem deva ser esquecido ou branqueado.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Vale tudo


Passos diz que juízes do Constitucional têm de ser melhor escolhidos
E quando julgamos que as coisas não podiam correr pior, eis que...

terça-feira, 27 de maio de 2014

terça-feira, 8 de abril de 2014

Praxes, indignação, estupidez e atrevimento

As praxes têm estado no topo da agenda destas últimas semanas. Esta é uma questão antiga e que não pode nem deve ser discutida de forma leviana, nem cega. A tendência nacional para assuntos adormecidos é discuti-los de forma irracional, em que defensores e detractores assumem posições extremadas sobre a natureza dos factos.

Num país de brandos costumes, como é habitual dizer-se, os ânimos nestas discussões, por regra, extravasam em larga medida as convenções instituídas. Uma parte significativa dos media não esclarece, nem procura a verdade; opta, na sua maioria, pela devassa da vida privada de alguns dos intervenientes dos casos mais mediáticos. A culpa deste estado de coisas não parte somente de um ou outro jornalista com menos escrúpulos. Nesta sociedade, em que a ânsia pela fama e pelo reconhecimento público passaram a mediar as relações sociais, os meios justificam os fins, ou o mesmo é dizer: o julgamento na praça pública, a capa do jornal, a reportagem na revista cor-de-rosa ou a abertura do telejornal.

Não aprovo as praxes e sempre me debati contra aqueles que as fixavam, do secundário ao ensino universitário. Em muitos dos seus protagonistas prevalecia (prevalece?), quase sempre, um sentimento revanchista e um direito inalienável a algumas práticas, abusos e prepotência de natureza diversa. Para além da “irreverência” de alguns veteranos, assistia-se, sim, à conquista de um estatuto de poder por parte daqueles que, no ano anterior, tinham sofrido com as manigâncias de quem os tinha praxado. A subida de posto era uma vitória e um direito inquestionável, cujo poder tinha de ser exercido a todo o custo. Não me recordo no Liceu de Antero de Quental, perante os actos mais absurdos e atentatórios, de existir qualquer complacência por parte de funcionários, professores ou mesmo da sociedade civil, aquando da famosa “procissão” pelas ruas da cidade de Ponta Delgada. Era tradição, e por mais idiota que fosse, ninguém a questionava. Tal continua a ser prática corrente. O estranho é discordar e andar desalinhado com as “tradições”. Felizmente frequentei uma universidade onde existia uma “comissão anti-praxe”, onde os actos menos condizentes com a suposta “praxe académica” eram alvo de atenção e intervenção por parte dos diversos órgãos académicos, das associações de estudantes ao presidente da direcção.

Ouvir alguns dos responsáveis de algumas das associações de estudantes do país sobre este assunto é penoso, tal é a bonomia que dizem presidir a este tipo de rituais. Existem sempre excepções mas temo que, neste caso, as boas práticas da “praxe” sejam uma minoria, se é que de todo elas existem.

Cito, a propósito desta discussão, alguém com quem nem sempre estou de acordo mas que aqui sintetiza subliminarmente o frenesim mediático em torno da polémica da “praxe académica”, catapultado pelas mortes dos jovens na praia do Meco e dos eventos que entretanto se sucederam. Escreve, assim, o jornalista José Manuel Fernandes (Público 31.01.14): “Ritual de iniciação, a praxe académica também não é muito distinta de outros rituais de passagem, alguns deles vindos da Antiguidade Clássica. (…) E de afirmação da hierarquia. Não estou com isso a justificar os excessos ou sequer a defender essas muitas e variadas praxes, estou apenas a constatar uma realidade antiga e a lembrar práticas que continuam bem presentes em muitos sectores da sociedade. Os estudantes universitários não são, de repente, as ovelhas ranhosas do Portugal contemporâneo. (…) O que nos indigna é a alarvidade, o sadismo, o sexismo, a porcaria, a violência. Só é pena que não indignemos também por a alarvidade se ter tornado cultura dominante e aceite, por encher a programação das televisões (…)”.

A indignação do Portugal Contemporâneo é feita de ‘likes’ inconsequentes, construídos por ignorância e pela frustração destes dias complexos e confusos, num tempo em que estamos todos, talvez, menos tolerantes ou com menos propensão para tolerar atentados a direitos fundamentais. Se bem que temos sido muito complacentes com a “estupidez” e “atrevimento” da governação que preside este país.


* Publicado na edição de 03/02/14 do AO
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quarta-feira, 19 de março de 2014

Um longo Inverno

O governo Passos/Portas diz aos portugueses para não entrar em “euforia” (!) quando, na prática, são os próprios que estão em êxtase e se desdobram em declarações e interpretações, umas mais fantasiosas do que outras, da realidade dos números.

A crueza do muito por que passa o país não importa e não é para aqui chamado. As dificuldades infligidas pela austeridade cega, o desemprego e as falências em catadupa são um peso a pagar pela “ilusão da prosperidade”, diz-nos a Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, que em entrevista à TVI deixa um aviso a este povo irresponsável e amoral: “as pessoas não podem ter a expectativa de voltar ao que era”.

O tom cândido e nada paternalista com que o Governo da República insiste em fustigar os contribuintes que os sustentam - em particular o sector público e os pensionistas, os que mais têm sofrido com o “custe o que custar” - parece não ter um fim à vista. Nas palavras contidas da Ministra das Finanças, que não se cansa de o dizer, “o caminho que falta fazer em termos de consolidação orçamental é longo e não me canso de repetir. É bom que as pessoas tenham essa consciência”.

Que consciência é esta de que nos fala a ministra? Terá ela consciência das contingências por que passam as pessoas? Haverá necessidade desta repreensão colectiva? E que consciência é que preside ao Conselho de Ministros?

Por estes dias a consciência que assiste a Maria Luís Albuquerque permite-lhe a afirmar coisas como “estamos a acelerar esse caminho sem acelerar os esforços”; ou “no final do programa teremos mais liberdade mas não liberdade plena”. Será que o governo está a tomar consciência das dificuldades que nos assistem ou repete-se até à exaustão na (vã) tentativa de se convencer que está no caminho certo?

O défice orçamental em 2013 andará à volta dos 5%, dentro dos limites definidos pelos credores internacionais e construído através dos "ganhos de eficiência do fisco" contra a evasão fiscal, do aumento das receitas do IRS e das receitas extraordinárias dos mais de 1277 milhões de euros arrecadados por intermédio do perdão fiscal. Mais extraordinário é o facto de se ter ficado a conhecer que, sem as medidas adicionais, o défice orçamental de 2013 teria registado um "excedente de 500 milhões de euros" face ao limite de 5,9% definido no segundo Orçamento Retificativo, apresentado em outubro. O que para a Maria Luís Albuquerque significa que "mesmo sem as medidas extraordinárias, teríamos cumprido o objetivo orçamental com que nos comprometemos no âmbito do programa".

Tenho alguma dificuldade em perceber esta ânsia de propagar a intensidade da austeridade como hoje a sentimos, sabendo de antemão que podíamos ter efectuado todo o ajustamento de redução da despesa pública de forma menos intensa e sem os enormes custos sociais que estamos a pagar.

Este é um governo que recusa a ideia de que há uma "enorme insensibilidade social" na prossecução deste plano. Contudo, a despesa com o rendimento mínimo, o complemento solidário para idosos, e muitas outras prestações sociais, desce. A repercussão social e económica desta missão é enorme e a recuperação da confiança dos portugueses no seu país e em quem os governa não se afigura tarefa fácil. Ou estaremos perante uma relação irremediavelmente perdida?

Enquanto isto, o governo Passos/Portas já sonha com sol e o calor de um Verão precoce e que está previsto chegar lá para Maio. O frio só agora começou e, por aquilo que nos dá a ver, o Inverno reserva-se-nos longo.


* Publicado na edição de 27/01/14 do AO
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segunda-feira, 10 de março de 2014

Vox populi

Angra do Heroísmo, Açores, Março 2014

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Discussão pública

O meio da criação, produção e difusão cultural no arquipélago dos Açores evoluiu consideravelmente desde o final da década de noventa, altura em que regressei à ilha.

A informação e a formação de criadores e público é hoje maior, melhor e mais exigente.

As condições de apresentação ao dispor dos artistas (e aqui a leitura é transversal a todas as áreas artísticas) são, na maioria dos casos, excelentes. E nem sempre reconhecidas.

Garantidas que estão as necessidades físicas, é fundamental trabalhar no sentido de incentivar e proporcionar condições de criação e de difusão, através da itinerância interna no arquipélago e em cada ilha, bem como perspectivar alcançar outros palcos, sobretudo no continente português.

Não hajam ilusões: este caminho não é fácil. É difícil. E com isto não estou a dizer que nos devamos menorizar, mas devemos ter consciência da nossa importância no espectro nacional - sendo que existe por parte de programadores e instituições culturais nacionais um enorme desconhecimento daquilo que por cá se faz, com honrosas excepções, é certo.

E aqui como em muitos outros sectores nos Açores - apesar do muito que já foi feito - temos um longo caminho a trilhar.

Neste sentido, e fruto das profundas alterações na forma como se faz e promove a cultura, o Governo dos Açores, através da Direcção Regional da Cultura, lançou em dezembro à discussão pública um pacote de diplomas do setor da cultura, disponíveis no portal do Governo.

Estas propostas visam sobretudo a alteração do regime de apoios a conceder aos agentes que desenvolvam atividades culturais consideradas de relevante interesse para a Região e o regulamento geral desses apoios.

No âmbito da discussão pública, terá lugar um debate sobre a alteração da legislação dos apoios a atividades culturais amanhã, terça-feira, 21 de Janeiro, pelas 20h30, no auditório da Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Ponta Delgada, com a presença do Director Regional da Cultura.

Considero que a participação neste tipo de iniciativas é fundamental e todos devem dar o seu contributo de modo tornar mais eficaz e ágil a proposta governamental. Quem melhor do que aqueles que estão no terreno para responder aos desafios e aos desígnios de um tempo que é novo? Contudo, há quem ainda não tenha percebido que o passado já era, que é necessário mais profissionalismo, planeamento e pragmatismo. Quanto a isto não há volta a dar. E não, não estou a ser fatalista.

Por cá, continuamos a tratar de forma igual coisas que são diferentes. E não falo apenas da comunicação social: os critérios deviam e devem ser outros no apoio aos diferentes agentes culturais. E este é para mim um dos grandes méritos desta proposta de alteração dos apoios culturais – a introdução de critérios de ponderação que fazem com que a análise seja balanceada por dados objectivos e concretos, em que o histórico e o mérito, por exemplo, são valorizados. Todos têm direito a trabalhar e apresentar o seu trabalho mas nem “tudo é arte, nem todos são artistas” (João Louro, Público 15.01.14). Há lugar para todos, os espaços é que podem ser diferentes.

É necessário um trabalho de crítica para aquilo a que assistimos e consumimos, seja um livro, uma peça de teatro ou um concerto. Falta-nos isso. Bem sei que os tempos não estão propícios a este investimento por parte dos jornais mas é algo pelo qual devemos lutar. E para balizar o que aqui digo socorro-me das palavras reflectidas de António Guerreiro (Público/Ípsilon 20.12.13), na medida em que é "necessário reconhecer que há uma diferença fundamental entre crítica e divulgação. (…) Mas, a essa distinção, sobrepõe-se o procurado espectáculo do gosto e da opinião. Para o discurso crítico as estrelas são um obstáculo com o qual é difícil lidar; o discurso da divulgação precisa das estrelas para parecer discurso crítico. O primeiro constitui-se através de uma argumentação e nela funda todo o juízo de valor; o segundo dispensa a argumentação crítica e faz das estrelas uma asserção absoluta e autoritária". A discussão é longa mas profícua, digo.


* Publicado na edição de 20/01/14 do AO
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