A campanha eleitoral não começou (oficialmente) mas o embate político, como a meteorologia, tem estado morno e à mercê de um pacto de não-agressão.
Para Manuel Carvalho, editor do Público, o frente-a-frente (televisivo) entre líderes partidários tem ocorrido sem excessos de linguagem, ou contorcionismos de ocasião, os portugueses querem ouvir os políticos e a comprová-lo estão os estudos de audiências, fazendo com este período de pré-campanha pareça, “como poucas vezes pareceu, uma campanha de uma democracia moderna e madura” (14/09/19).
Mais do que questiúnculas, e questões fracturantes, que agora se assumem estruturantes, num país a múltiplas velocidades e que cuja realidade (ainda) carece de necessidades fundamentais, parece esdrúxulo que, pelo menos de forma mais ou menos aparente, a agenda seja preenchida pela inverosimilhança de algumas propostas.
Aliás, a diatribe eleitoral vem apenas corroborar a clivagem existente entre os centros urbanos e o resto do território, cuja desertificação populacional e deslocalização económica sufoca a sua existência quotidiana.
A população procura uma resposta eficaz para os seus anseios e para as entropias com que se depara no seu dia-a-dia. Os grandes temas da discussão política (deste tempo) não podem ser menorizadas mas parecem descontextualizadas da urgência dos dias.
Existe um descrédito nas sociedade contemporâneas (ocidentais) quanto ao desempenho das funções políticas/serviço público, e apesar de alguns progressos, é necessário alterar a forma como se organizam as campanhas eleitorais, mas “só por cinismo torcem alguns entre nós o nariz e desvalorizam o trabalho que os responsáveis realizam para esclarecimento geral. Dir-se-ia que estão cansados da democracia e não acreditam na sinceridade dos propósitos dos actores políticos, a quem imputam as piores intenções. Alguns destes, infelizmente, dão razões de queixa, mas não se pode julgar todos pelos erros de uns quantos de inferior qualidade cívica” (João Bosco Mota Amaral, 10/09/19).
Presos ao populismo da imediatez mediática e do politicamente correcto, políticos e partidos agarram-se à redução dos custos associados às campanhas e - na procura pela validação popular (do like virtuoso) - fazem por tornar pública as suas opções com o avale do Presidente da República. Não basta. Era olhar para o modelo norte-americano para daí retirarmos algumas lições. A começar pela institucionalização dos lobbies.
Na desconfiança destes dias, as pessoas andam presas ao(s) ecrã(s) e alimentam (profusamente) a sua ‘second life’, pelo que a intenção de introduzir o voto electrónico como forma de ‘acabar’ com a abstenção (e alienação colectiva?) é, na essência, um convite ao comodismo e à passividade.
Passaríamos a ter uma democracia sufragada no sofá, cuja implementação acarreta inúmeros riscos, a começar pelo garante da salvaguarda dos dados informáticos e dos resultados do escrutínio eleitoral. Considero que o problema não está no meio, nem na facilitação da forma como se vota (independentemente desta ser uma discussão em curso e deste ser um processo que carece de aperfeiçoamentos).
A melhoria da qualidade da nossa (jovem) democracia reside na forma como cada um nós exerce, responsavelmente, os direitos que lhe foram concedidos. Por este andar, o wifi terá de ser subsidiado para garantir que os cidadãos possam exercer livremente o seu direito de voto.
Tal como José Pacheco Pereira (07/09/19), subscrevo o candidato que não vai “fazer 50 coisas” mas que se compromete a “fazer três, mas três estruturantes”.
Para tal, bastará coragem (política) e um sólido compromisso ético (e colectivo).
* Publicado na edição de 16/09/19 do Açoriano Oriental
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