domingo, 2 de novembro de 2025

Custos (de insularidade)













A partir de 2018, não é demais afirmá-lo, a paisagem cultural no arquipélago dos Açores alterou-se, significativamente, devido à possibilidade de artistas e instituições acederem aos concursos e apoios da Direção-Geral das Artes (DGARTES).

Esta circunstância introduziu equidade e justiça num processo que estava desequilibrado, até porque os agentes culturais nacionais não estavam (e não estão) impedidos de concorrer aos apoios regionais (da Direção Regional da Cultura), cuja ordem de grandeza não é sequer comparável, nem poderá vir a sê-lo. Não vale a pena escamoteá-lo.

A alteração do diploma que definiu este novo modelo de apoio às artes resultou (unicamente) de uma opção política estratégica (e fundamental), na vigência de um governo liderado por António Costa, a de colocar um ponto final nesta discriminação relativamente às regiões autónomas e, noutro prisma, abrir caminho para uma maior aproximação, coesão e cooperação com o sector cultural (nacional).

Entre as várias modalidades de apoio (sustentados/projectos) e domínios de actividade (da música às artes visuais), o montante de apoio anual da DGARTES (nos Açores) atingiu, em 2025, um valor superior a 1.65M, aos quais se somam a participação na RTCP - Rede Teatros e Cineteatros Portugueses e na RPAC - Rede Portuguesa de Arte Contemporânea, faltando explorar a implementação de uma orquestra regional em território insular (a qual está prevista em Decreto-Lei).

Como atrás se referiu, esta possibilidade de financiamento veio conferir outra capacitação às estruturas locais, nomeadamente, a contratação de equipas a tempo inteiro, num caminho de profissionalização que importa consolidar.

A existência de apoios nacionais que contemplem os artistas a residir e a trabalhar nas regiões autónomas, não retira importância aos apoios locais e regionais. A natureza de cada um é distinta e, contrariamente ao que se possa supor, não existe uma sobreposição, mas, uma necessária complementaridade. Num sector muito marcado pela precariedade, apesar das elevadas qualificações académicas dos seus protagonistas, este será o único caminho para a sustentabilidade destas estruturas e um meio de fixar profissionais e recursos humanos especializados.

Contudo, a natureza da nossa geografia faz com que existam desafios e sobrecustos acrescidos a quem aqui desenvolve uma actividade económica, seja ela cultural ou não. Tanto assim é, que existem majorações para vários sectores produtivos, os quais pretendem mitigar as contingências da ultraperiferia europeia e dar mais competitividade ao que é produzido localmente. Na Cultura não pode ser diferente.

Para além disto, a intensificação turística aumentou exponencialmente os valores do transporte aéreo, do alojamento e da alimentação, factores determinantes num processo de tomada de decisão, mas que, neste momento, constituem uma forte condicionante ao desenvolvimento de uma direção artística.

Na assinatura do protocolo de financiamento de Ponta Delgada 2026 – Capital Portuguesa da Cultura, ficamos a saber que o Ministério da Cultura e a Secretaria de Estado do Turismo majoraram em 30% o valor inicialmente previsto, devido a “custos de insularidade”, até porque nas palavras da Ministra da Cultura: “um milhão de euros para Aveiro e Braga é uma coisa, para os Açores, é outra”.

E por ser verdade o que aqui foi (só agora) interiorizado, o significado deste compromisso não deve ficar circunscrito à realização da Capital Portuguesa da Cultura, em 2026, deverá ser assumido pelo Ministério da Cultura em futuros concursos e linhas de financiamento promovidas pela DGARTES, extensíveis, muito particularmente, a todos os que vivem e trabalham em territórios insulares ultraperiféricos (como os Açores e a Madeira).

É, igualmente, na afirmação destas (justas) reivindicações que se constrói “o lugar do amanhã” (o tema de Pdl26).

[+] publicado na edição de 28 Outubro 2025 do Açoriano Oriental

[++] imagem Pdl26

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