Ministério da Cultura vs Secretaria de Estado
A pretexto da crise e das profundas reformas que Portugal terá que continuar a introduzir na administração pública e na organização do Estado, surgem propostas de futuros governos, “magros e enxutos” como disse Passos Coelho, onde o Ministério da Cultura se reduz a Secretaria de Estado. Esta tese, defendida também pelo CDS, assenta na presunção de eliminar as “gorduras” e os gastos administrativos, sem uma reflexão mais séria e fundamentada, quer do ponto de vista financeiro, quer, muito mais grave, do ponto de vista político e programático.Artigo de opinião da Ministra da Cultura na edição de 28 de Abr'11 da Revista Visão.
Analisemos como os nossos 26 parceiros na União Europeia (a braços com a mesma crise que todos vivemos na Europa) encaram esta temática: 20 Países têm Ministérios da Cultura –, Espanha, Itália, Dinamarca, Grécia, Suécia, Irlanda (que promoveu a Cultura a Ministério, no pico da crise, com o FMI no país), Finlândia, França, Alemanha, Reino Unido e Bélgica, e quase todos os da antiga Cortina de Ferro. Em 3 Países, a Cultura é associada à Educação – Áustria, Holanda, Chipre e … 2 países com Secretarias de Estado da Cultura - Malta e Hungria.
Dos 27 países da UE, apenas em dois, Malta e Hungria, a Cultura é atribuída a Secretarias de Estado. São estes os modelos que queremos seguir? É esta a ambição que merece um país com uma língua falada por 250 Milhões de pessoas espalhadas por 5 continentes?
É esta a estratégia de afirmação de um povo com 8 séculos de História e uma actividade criativa com presença regular nas listas dos mais importantes prémios internacionais de arquitectura, literatura, cinema, museologia, apenas para referir os mais mediáticos?
E com que argumentos? “Gordura”? A direita portuguesa prova assim que não integra no seu conceito ideológico a noção de que o valor simbólico global da Cultura é incomensuravelmente maior do que a soma das partes, que das suas linhas programáticas resulta o seu real valor civilizacional – a identidade global portuguesa, que assenta, única e exclusivamente, na sua Cultura. E que é a partir da sua identidade, reconhecível como um todo na sua transversalidade económica, na capacitação intelectual, respeitabilidade e atracção internacional, que Portugal tem a sua oportunidade de afirmação.
Foi com os governos liderados pelo Partido Socialista que se afirmaram as principais conquistas da Cultura em Portugal, porque o PS sabe que a consolidação da democracia depende do conhecimento, da coesão social através da coesão cultural, da integração multicultural, da educação do saber. Foi o PS que criou em 1995 o Ministério da Cultura (MC), uma medida fundamental numa democracia avançada, que introduziu profundas alterações no paradigma cultural português, a mudança do discurso político e a assunção de uma maior responsabilização do Estado nesta área.
Apesar do peso orçamental do MC não ser sempre compatível com a sua ambição, a sua acção é de enorme abrangência. Regula todo o Património, tangível e intangível, protege a língua e direitos de autor; gere, apoia e financia centenas de entidades culturais em todas as áreas, para além de manter compromissos internacionais relevantes, quer no quadro da UE, quer na CPLP, quer em outras organizações internacionais.
Em 1994, na última Secretaria de Estado da Cultura (PSD) com menos instituições e 25% de receitas próprias, gastou-se 61% do orçamento em funcionamento; em 2011, com muito mais obrigações a seu cargo, gasta-se 67%, com 41% de receitas próprias. Os gabinetes da MC e do SEC custam actualmente € 2.532.156 (inclui todos os custos com pessoal, estrutura, funcionamento, representação internacional). Em 1994, o gabinete do SEC custou € 2.346.528.
Analisando com seriedade, conclui-se que a extinção do MC teria um custo político e simbólico muito superior ao ganho orçamental. Ao invés de se eliminar um valor operacional determinante no Portugal que se quer para o futuro, num retrocesso sem real fundamento económico (que nem a direita europeia ousou), dever-se-ia antes defender o seu alargamento a áreas correlacionais, indissociáveis da sua acção, como o Audiovisual, a promoção cultural externa e o Turismo, cada vez mais centrado na oferta cultural. Em vez de se advogar a sua insignificância no quadro das políticas estratégicas de desenvolvimento nacional, dever-se-ia aumentar o seu peso e a sua abrangência. São questões civilizacionais, como esta, opções políticas de fundo, que têm sido defendidas em Portugal pelo PS e que importa ter em conta nos tempos que correm.
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