segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Ganhar o Futuro

[Tinha planeado escrever algo completamente diferente. Lamentavelmente, a agenda noticiosa da semana não deixou margem para dar folga aos assuntos na ordem do dia. Posto isto, vamos ao que interessa.]

Não é preciso ser economista ou superdotado para perceber o clima depressivo em que se encontra o país, as pessoas e a economia real. A manifestação deste sábado é a prova que, pelos vistos, faltava.

Passos Coelho já tinha feito um pré-anúncio para mais medidas de austeridade quando afirmou, a 05 de Setembro, que «Todos desejaremos, não tenho dúvida nenhuma, ultrapassar as nossas dificuldades sem sobrecarregar mais os portugueses com impostos, mas nenhum de nós está em condições de dizer que não vai tomar uma ou outra decisão se ela tiver de ser adoptada» (!).

O formato para o anúncio de novas medidas de austeridade revelou-se imponderado, "num discurso trapalhão e mal escrito, despachado à pressa entre um jogo de futebol e um concerto em que ele próprio resolveu cantar o inesquecível clássico 'Chamava-se Nini/vestia de organdi'" (Vasco Pulido Valente, Público 14/09/12).

O Governo de Passos Coelho não previu, e aí mostrou o quão distante está da realidade, a reacção dos portugueses. Perante a inevitabilidade do agravamento da austeridade com base numa pretensa equidade dos sacrifícios, a indignação tomou posse dos acontecimentos, o país gritou - Basta!

O amplo consenso social e político dito "abençoado" pelo Ministro das Finanças revelou-se, afinal, aparente. Este Governo anda a fazer "experimentalismo social" com as pessoas. Só assim se compreende que o Governo de Passos Coelho, por sua conta e risco, exija aos portugueses um esforço de redução do défice "na ordem dos 4,9 mil milhões de euros", valor quase seis vezes superior à redução necessária combinada com a troika. Isto só pode ser explicado de duas maneiras: ou o valor está incorrecto, e o Governo da República anda a ocultá-lo; ou a margem para errar é enorme e Vítor Gaspar está a precaver-se de futuros deslizes.

Os portugueses não se têm esquivado aos sacrifícios. O que não vislumbram é uma luz ao fundo do túnel. Os sacrifícios impostos não têm resultado. Pior. Têm resultado, isso sim, num agravamento generalizado da situação económica do país. E é isso que ninguém compreende, que sejam sempre os mesmos a pagar a factura, e o Estado não reduza, de forma concreta, a sua despesa.

Quando se diz que o que importa são as empresas exportadoras, não estamos a negligenciar todo o restante tecido empresarial português que representa a esmagadora maioria da força de trabalho do país?! Não é isto um despautério e uma incoerência abissal?! Olhamos para fora para não ligarmos à realidade que nos rodeia?! Isto faz-me lembrar o Ministro que no estrangeiro não fala de assuntos internos e o outro que não fala no país, mas que aproveita para falar no estrangeiro aquilo que não diz cá dentro.

Nos Açores, esta sucessão vertiginosa de acontecimentos também tem gerado as reacções mais curiosas, umas mais estranhas do que outras. Apesar de, para mim, algumas não constituírem surpresas, mas serem, sobretudo, a confirmação de algumas certezas.

O PSD/A deve ser a única extensão do partido que compreende as novas medidas de austeridade. Mas, mais grave é que este é mais um exemplo daquilo a que o PSD/A já nos habituou. Sempre que há uma decisão do governo de Passos Coelho que é danosa para os Açores - das viagens aéreas, da ANA, da Universidade ou da RTP/A - o PSD/A presta-se, não em contrapor com as maleitas que nos querem impor, mas em encontrar soluções à custa do orçamento regional para compensar os prejuízos que nos impõem.

A demagogia e a promessa facilitista tomaram de assalto o discurso eleitoral da líder do PSD/A quando ainda faltam 26 dias para o final da campanha. Em política não pode valer tudo, com risco de tudo perder.

Os Açores querem outro candidato e outro discurso para ganhar o futuro que, "mais próximo ou mais remoto, não vai resgatar-se miraculosamente" (José Luís Ferreira, SLTM).

* Publicado na edição de 17/09/12 do AO
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